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20 de Novembro: Dia Nacional da Consciência Negra

A história do Brasil é repleta de contradições, inverdades, conflitos e lacunas

Valter Machado da Fonseca
Publicado em 18/11/2010 às 19:54Atualizado em 17/12/2022 às 06:58
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A história do Brasil é repleta de contradições, inverdades, conflitos e lacunas. Pode-se dizer que a história de nossa nação é carente de líderes, de heróis. Analisando, criteriosamente, as entrelinhas das narrativas que compõem os anais da nossa história, pode-se perceber que, ao longo desses nossos quinhentos anos, sempre se tentaram fabricar heróis fictícios para justificar as contradições e lacunas presentes na história do Brasil. Como, por exemplo, a tentativa de enaltecer a figura de Caxias ou Duque de Caxias, como se ele fosse o exemplo máximo do patriotismo. Porém, a verdadeira História mostra-nos que ele não passou de mercenário, um assassino a serviço da Inglaterra que, em conluio com nossos hermanos uruguaios e argentinos, fez as maiores atrocidades com nossos também hermanos paraguaios. Tudo para sufocar o forte desenvolvimento econômico que florescia no Paraguai e que ameaçava a supremacia britânica. Assim, a nossa escola vem incutindo na cabeça de nossas crianças, jovens e adultos, as inverdades produzidas na fantasiosa fábrica brasileira de heróis.

Recorro ao exemplo de Caxias, ironicamente patrono do nosso Exército, para iniciar uma reflexão sobre o “Dia Nacional da Consciência Negra”, comemorada neste dia 20 de novembro. Até bem pouco tempo, o nosso povo e os nossos afrodescendentes eram enganados com a farsa do “treze de maio”. Aliás, muitos continuam a ser enganados com esta data. A princesa Isabel, assim como o nosso Caxias, não passa de mais uma enganação da nossa história. Ela [figura meramente decorativa da monarquia portuguesa] não passou de um “pau mandado” do capital internacional. Aliás, o Brasil foi um dos últimos países do mundo a “abolir” a escravidão. A tal princesa não foi a grande heroína, da qual se rejubila nossa fábrica de heróis. Na verdade, a tão comemorada Lei Áurea foi assinada a contragosto pela monarquia portuguesa; ela foi uma forma menos vergonhosa de o Império não se curvar, abertamente, diante dos movimentos abolicionistas internos e externos ao país.

E quem, de fato, a Lei Áurea libertou?

Ao contrário do que divulga a nossa história, a “Lei Áurea” foi a única solução encontrada para a saída honrosa dos “Barões do Café”, da oligarquia rural oriunda dos “Senhores de Engenhos” e dos latifundiários, da enrascada política em que se meteram perante o movimento abolicionista mundial e até mesmo dentro do país. Então, a Monarquia portuguesa, em crise, libertou, por intermédio da promulgação da “Lei Áurea”, não os afrodescendentes, mas sim os representantes da oligarquia rural e dos “Barões do Café” no Brasil. Mas e os negros? O que ganharam com isso? Nada! Absolutamente nada! Aliás, a escravidão já dava seus últimos suspiros no Brasil; a abolição se consolidaria pela própria força da resistência negra e do movimento abolicionista. Isto significaria a derrota da monarquia e a vitória da resistência negra. Então, para eles [os negros] o que restou foi o abandono à própria sorte. Foram despejados nas cidades [ambiente ao qual não estavam adaptados], sem recursos e sem quaisquer condições de sobrevivência, somando-se assim ao exército de desempregados das metrópoles. Surgiam em nosso país os primeiros núcleos de favelas, aprofundando em seu nascedouro a desigualdade social no país. Aí é importante ressaltar a indagaçã Por que pagar salários aos italianos, e não aos nossos irmãos africanos?

E a chamada “dívida social” que temos com a etnia africana?

Em primeiro lugar, é preciso indagar: quem, de fato, fez a tal dívida com nossos irmãos africanos? Foram os trabalhadores ou as elites? Foi o Brasil Colônia ou o Império português? O discurso da “Dívida social”, arduamente defendida pelo setor majoritário de nossos governantes, tem como “pano de fundo” a tentativa de mascarar a imensa desigualdade social que marca nosso país. Trata-se de um subterfúgio para fragmentar, dividir a classe trabalhadora brasileira, colocando nas costas de toda a população os desmandos, as torturas, os estupros e assassinatos cometidos pelas elites representantes do Império português. É importante salientar que o preconceito se dá em função da exclusão social, e não pela cor da pele. Na “linha de pobreza” todos os marginalizados possuem a mesma cor da pele: não existe negro, branco, indígena, mulher, amarelo. Todos possuem a mesma cor, ou seja, ninguém possui nenhuma cor, todos são marcados pela névoa opaca da fome, do desemprego, da miséria.

Então, este dia 20 de novembro é importante não somente para nossos irmãos negros, mas para o conjunto dos marginalizados do Brasil. Ele deve servir como um dia de reflexão, de luta e debates sobre a emancipação dos dizimados, dos despossuídos, dos mutilados, dos invadidos de quaisquer cores. É preciso preencher as lacunas de nossa história com os verdadeiros heróis oriundos dos milhares de quilombos e dos infinitos Palmares existentes em nossa terra. O “treze de maio” é uma data que deve ser esquecida e a Resistência Negra é uma realidade que deve ser sempre revivida e reavivada em nossas mentes e nossos corações.

(*) escritor, graduado em Geografia pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU); mestre e doutorando em Educação também pela UFU; docente da Universidade de Uberaba (Uniube)

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