A insônia do médico
No caixa especial de um hipermercado conversavam amistosamente dois experientes cidadãos (**). O mais novo é um renomado médico
No caixa especial de um hipermercado conversavam amistosamente dois experientes cidadãos (**). O mais novo é um renomado médico com quarenta anos de profissão e o outro, um bem sucedido empresário. Eles conversavam sobre o futuro Hospital Regional de Uberaba.
O empresário me vendo chegar abraçou-me e logo disse: - “Ó; eu sou contra a construção do Hospital Regional junto ao Cemitério São João Batista!” Lembrando as orientações de conselheiros meus, agradeci discretamente aquela importante adesão e em seguida ouvi o médico que disse: - “João. Dia desses eu sonhei que havia duas pessoas com as pernas amputadas e sem vida, deitadas em caixões, uma ao lado da outra. De seus corpos escorria um líquido viscoso acinzentado e mal cheiroso. Era o necrochorume! Acordei num sobressalto e não mais dormi. Meu sono se foi, e em seu lugar veio uma interminável insônia.”
Mas doutor - perguntei - o senhor é médico e perdeu o sono por isso? E o que sobra para mim que não sou médico? “João. Eu não perdi o sono por mim, mas pelas pessoas que irão ficar expostas a riscos se o hospital regional for construído junto ao nosso cemitério”. O empresário, outras pessoas e eu assistimos uma paciente aula daquele profissional, que nas faculdades não são ministradas.
O ocorrido deu-me ânimo para me dirigir à sensibilidade da pessoa especial nesse process Sr. Prefeito Anderson Adauto; V.Exa. declarou numa entrevista ter “comprado uma consultoria” para provar que o local escolhido para o HRU é o melhor. Nos anos noventa V.Exa., diante de uma consultoria feita sobre a pesagem do nosso lixo, representou contra os seus contratantes no Ministério Público. Hoje o processo tem quase 70 volumes! V.Exa. e eu temos um plano de saúde, mas não nos esqueçamos daqueles que são obrigados a se humilhar na rede pública. Não onere os cofres públicos com consultoria desnecessária. Sugiro-lhe uma simples pesquisa de opinião pública em nossa cidade. Leve em conta expressões de sensatos Vereadores ditas no plenário da CMU, no dia 02/06/10, destacando-se as do Sr. Presidente Lourival dos Santos: “Coloquemos o orgulho de lado e ouçamos o povo! O que adianta fazer um hospital hoje e as pessoas recusarem a usá-lo amanhã? Formemos uma comissão para estudar o assunto!”
Sr. Prefeit o necrochorume do cemitério, o posto de gasolina a menos de 70 metros do futuro hospital, o sistema viário subdimensionado, as bactérias em suspensão, a infecção hospitalar etc., são ínfimos diante da voz geral dos seus governados: “Cê já pensou, o sujeito estar internado e ter a paisagem de um cemitério? Só mesmo em Uberaba!” É... a insônia do médico tem razão de ser...
(**) Por motivos óbvios omiti os nomes de todas as pessoas e do hipermercado.
(*) presidente do Fórum Permanente dos Articulistas de Uberaba e Região; membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro