O nome para a falcatrua aprontada pelo magnata Bernard Madoff, pirâmide, é bem apropriado. A pirâmide é uma forma de recolher o dinheiro dos incautos, dos desprevenidos, dos gananciosos, que muitas vezes não se contentam apenas em ganhar dinheiro com aplicações financeiras, mas querem ganhar mais do que permitem as regras do mercado.
O idealizador desse sistema faz a base do projeto, informando aos interessados que é garantida a todos uma renda espetacular para as aplicações que forem encaminhadas ao sistema. É imprescindível que quem comanda esse sistema tenha lastro financeiro, entenda bem desse ramo de negócio, seja conhecido e inspire confiança. E todas essas exigências cabem no inteligente Madoff, o que lhe facilitou angariar os primeiros investimentos.
Logo no início, os primeiros investidores puderam constatar um lucro vultoso em suas contas. Então, investiram mais na pirâmide. É certo que esses primeiros lucros foram pagos com recursos próprios de Madoff. Como uma bola de neve, o dinheiro começou a entrar ao montes nos cofres da pirâmide.
Já, então, os juros ou ágios ou lucros devidos aos primeiros investidores eram pagos com o dinheiro dos últimos depositantes. E investidores famosos, como jogadores de beisebol, apresentadores de televisão, fundações e, imaginem, até bancos, que fizeram investimentos próprios, aplicaram fundos de seus clientes no negócio.
O esquema pirâmide pode ter atingido a cifra de US$ 50 bilhões antes de ruir. E foi a pique por causa da grave crise financeira em que se atola o mundo. Instalada a crise, todos foram buscar os investimentos feitos. Onde estava o montante? Sumiu.
A Justiça norte-americana, que está processando Madoff, já levantou uma lista de possíveis investidores. No documento de 163 páginas aparecem famosos e até parentes de Madoff, pois o homem é um terror e não perdoou nem a esposa.
Descoberto o esquema fraudulento, ainda houve quem procurasse Madoff para investir um pouco mais na pirâmide. Por certo esses haviam recebido uma boa nota e, como o saco da ambição nunca fica cheio, desejavam obter mais lucros. Nem desconfiaram de que a aplicação que faziam estava escorrendo pelo ralo.
E por que escrevemos sobre esse assunto, quando poderíamos falar de amenidades? Nós, uberabenses, tivemos na cidade um quase esquema de pirâmide quando apareceram por aqui algumas pessoas de cabeça boa e coração ruim, propondo recolherem aplicações de uberabenses, prometendo, em troca, alto rendimento mensal. Naquele tempo os juros bancários para empréstimos em geral giravam em torno de 1%, e a oferta que os idealizadores do sistema apresentavam era atraente. Para ajudar a avivar a memória de todos, a empresa dos tomadores de dinheiro chamava-se Flórida.
A Associação Comercial e Industrial de Uberaba promoveu uma reunião com a turma da Flórida, convocando os prováveis (eram muitos) investidores para uma reunião de esclarecimentos, que foi realizada em uma sala do edifício da Drogasil. A sala ficou pequena, tanta gente apareceu por lá. E foi curioso ver como os futuros investidores defendiam a Flórida, interessados que estavam no lucro fácil. Um senhor, muito conhecido na cidade, informou que tinha ido a São Paulo conhecer os escritórios da Flórida e que ficara encantado com o que vira. Uma pesquisa feita com mais cuidado mostrou que o local ocupado pela Flórida era uma sala alugada especialmente para impressionar visitantes.
A Flórida simplesmente desapareceu de Uberaba. Houve, na ocasião, uma sobra de desconfiança para uma companhia de cigarros homônima daquela, cujos veículos de distribuição do produto percorriam a cidade para colocar o mesmo nos estabelecimentos comerciais. A Flórida dos cigarros fez publicar anúncio nos jornais informando que não tinha ligação alguma com a outra Flórida, a financeira.
A intervenção oportuna de pessoas antenadas na cidade que fez com que a pirâmide fraudulenta não fosse levantada por aqui e não chegasse a causar aborrecimentos como os que a pirâmide de Madoff causou.
(*) membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro