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Algumas vantagens

Evódio realizava a sua caminhava regular lá no piscinão

Gilberto Caixeta
gilcaixeta@terra.com.br
Publicado em 30/10/2012 às 20:54Atualizado em 19/12/2022 às 16:36
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Evódio realizava a sua caminhava regular lá no piscinão, quando passou por ele, em sentido contrário de sua caminhada, uma ex-aluna. Ela estava bela, mesmo em caminhada, podia-se sentir a sua fragrância úmida. Seu passar era leve, suave, como se estivesse em passarelas do bem vestir. Passou como se passa ao largo. Cumprimentaram-se com os olhos e pelo sorriso pôde perceber que o canto dos lábios lhe dava um ar de menina entregue no tempo. Lembrou-se dela, não da escola onde fora sua aluna. Assim, continuaram a caminhada. O que ela pensou a seu respeito só soube por ela quando novamente passaram um pelo outro. “Você está no formol. Não é possível, você está do mesmo jeito à época que fui sua aluna.” Evódio agradeceu e seguiu o seu caminho. Ao longo relembrou-se da fala dela e se sentiu feliz por alguns minutos. Estar no formol não significa estar bem, embora ele estivesse, inobstante a sua ojeriza à velhice. Evódio tem horrores à velhice como tem da inutilidade. Vivia resmungando sobre a velhice e os benefícios dado a ela em fila. Disse a ele que ele deveria morrer antes que a velhice o abraçasse. Senti que ele não gostou muito de ouvir o meu palpite sobre viver e envelhecer. Evódio continuou o caminhar e se deparou com um sorrisinho no canto da boca. Ele gostou de ouvir aquela frase, afinal, se sentia jovem, embora a idade falasse o contrário. Talvez se parecer o mesmo de tempo atrás seja realmente um dos privilégios de quem não é bonito. Porque quando se é, qualquer queda de cabelo, ou estufar de barriga, ou um repuxar de pele, amarrotando-a, já desconfigura a beleza e o comentário torna-se inevitável. Ele era lindo na juventude, ou ela era maravilhosa... Ela está acabada, que corpão que ela tinha e hoje... É um inferno quando se é bonito, imagino. Duplamente difícil. Os alheios temem as pessoas bonitas e essas tendem a ficar a sós. A beleza tem também a desventura de caminhar pelos labirintos dos concursos, das disputas comparativas e até mesmo pode ser empurrado para uma vida não muito agradável quanto à tolerância. Quem é lindo não pode ser só arrumadinho, precisa sempre de algo mais. Daí a dificuldade que há na beleza; não resta dúvida que ela pode ser fundamental. Agora o oposto tem as mesmas dificuldades às avessas. Nada cai bem, tudo se esconde e só sobressai a feiura que chama tanta atenção como a beleza, mas que não traz os mesmos elogios. O ideal é o termo do meio, nem belo e nem bonito. Simpático. Agradável. Arrumadinho. Para quem não é belo, desconfigurar-se leva tempo, caso haja uma atenta observação por parte do outro. Evódio sempre disse que não se achava belo e nem feio. Conceituava-se como arrumadinho. Quando a sua ex-aluna passou por ele e sapecou aquela frase, tudo se rebobinou em sua memória e agradeceu o que sempre excomungava: a sua beleza inexistente.

(*) Professor

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