São várias as discussões acerca da existência de vínculo trabalhista entre trabalhadores e empresas que promovem a intermediação de negócios através de tecnologia digital, sendo famosas decisões envolvendo as gigantes Uber e iFood, em sua maioria, negando a existência do vínculo trabalhista.
Tal relação de trabalho, propositalmente precarizada, em nada contribui com a sociedade e com o próprio trabalhador, e, como o Estado brasileiro percebeu que, no final, pagará a conta, por permitir tal relação de trabalho (através do SUS ou de outros programas sociais), tratou de agir para transferir o custo de sua obrigação social para as empresas digitais de entrega, através da edição de Lei que estabelece obrigações destas com a mão de obra por ela angariada, mesmo que de forma autônoma e precarizada (sem vínculo trabalhista).
A Lei n.º 14.297, editada em 05.01.2022, obriga que empresas que prestem serviço de entrega por meio de aplicativo, ao menos durante o Estado de Emergência em Saúde Pública em decorrência no coronavírus, contrate Seguro contra Acidentes, sem período de carência, em benefício dos trabalhadores por ela cadastrados.
Outra vitória dos trabalhadores que prestam serviços a tais aplicativos de intermediação de entrega é que, em caso de afastamento de suas atividades laborais habituais em razão da infecção pelo coronavírus, lhes seja garantida uma assistência financeira pelo período de 15 dias, prorrogável por duas vezes por igual período.
Registra-se que empresas tomadoras dos serviços prestados pelos aplicativo não foram esquecidas pela Lei. A elas foi determinado que permitam que os entregadores utilizem instalações sanitárias de seu estabelecimento e tenham acesso a água potável.
A edição da Lei, embora represente um pequeno avanço na proteção daquela força de trabalho, serve para nos mostrar o quanto estamos distantes do ideal. Por exemplo, em caso de sequela em razão da infecção do coronavírus ou mesmo em razão de algum acidente, que obrigue o trabalhador a se manter afastado de suas funções por tempo superior a 45 dias, de onde virá o seu sustento, já que a Lei limita o período de responsabilidade das empresas de aplicativos e o trabalhador, em tais casos, não é contribuinte obrigatório do INSS?
E, no caso de descumprimento, tem multa em favor do Estado? Tem, sim senhor. R$5.000,00 por infração em caso de reincidência.
Se o intuito do legislador é proteger a força de trabalho, por que não o fez de forma efetiva?
Alexandre Rodrigues de Oliveira Signorelli
Advogado
alexandre@oliveirasignorelli.adv.br