Já não é grande surpresa constatar que vem por aí mais uma crise econômica, tão diligentemente contratada. Além da preparação possível, não faz mal buscar um pouco de inspiração nas artes, e uma boa fonte é o filme “A Grande Virada” (The Company Men – 2010).
A história quase poderia ser hoje, não fosse o detalhe de nenhum personagem possuir nem smartphone nem tablet, assim, ninguém passa o dia olhando para uma tela portátil. Fora isso, tudo atual.
Uma grande empresa enfrenta sucessivas reduções de pessoal, e o ambiente no escritório é de histeria difusa, mais ou menos contida. Ben Affleck lidera o elenco, e Tommy Lee Jones é o diretor antigão, fundador da empresa, que filosofa sobre o caminho percorrido, enquanto tenta evitar as piores consequências, já que não é possível evitar todas.
O elenco tem várias estrelas oscarizadas, inclusive Kevin Costner, como o cunhado pé no chão que, na hora do aperto, é quem tenta, de fato, ajudar. Não apenas com palavras bonitas, mas com ações concretas, ainda que acompanhadas de uma cara feia, porém, sincera.
Bons personagens têm que ter “arco”, ou seja, têm que evoluir e terminar a história diferentes de como começaram. Assim, vemos os companheiros de desventura enfrentando a situação de modos diferentes, desde os mais primitivos, bebendo, descontando a raiva em bolas de golfe, ou em telefonemas agressivos para os ex-patrões; até os civilizados, lidando com a perda de tudo o que têm, num progressivo e inescapável striptease patrimonial.
Em situações limite, só sobrevive o que é essencial, e a família faz toda a diferença. A esposa, forte e prática, ou a apática, ou a deslumbrada. Os filhos que colaboram, ou os que estão alheios. Os pais que comparecem quando tudo se vai. É nesse entorno que os homens se movem, enquanto buscam uma saída.
No fim, há uma volta às raízes, àquele ponto em que os objetivos são claros e honestos, antes que tudo se perca numa confusão entrópica. Capitalismo é excelente, desde que venha acompanhado de valores básicos virtuosos. Infelizmente, pelo caminho pagam-se tributos, e alguém vai morrer.
Enfrentar crises é muito bonito no cinema; na vida real, é muito ruim. Mas, já que não será possível evitar, fica a dica.
Ana Maria Leal Salvador Vilanova
Engenheira civil, cinéfila, ailurófila e adepta da caminhada nórdica
AnaMariaLSVilanova@gmail.com