Dois jovens peixes nadam, distraidamente, num lago enorme, enquanto conversam. Em sentido contrário, passa por eles um peixe já entrado em anos, que comenta:
– Olá, lindo dia, não? Que tal estão achando a água?
Os dois respondem ao cumprimento protocolarmente – Olá! Tudo bem! – afinal, são educados, e seguem seu caminho. Quando já estão fora do alcance do idoso, um deles pergunta ao outro:
– Mas, afinal, o que é “água”?
O velho peixe, tendo já saltado acima da superfície, sabe que está imerso em algo que, por ser tão onipresente e constante, já não nota. Ele vê a água e sabe que ela não é o fim de tudo, mas, apenas, parte da realidade.
Por falta de necessidade ou curiosidade, os peixinhos nunca saltaram. São um caso crônico de efeito Dunning-Kruger, em que a pessoa (ou, no caso, o peixe) crê dominar um assunto quando, na verdade, está apenas iludida quanto ao tamanho do próprio conhecimento.
Seres humanos, obviamente, são muitíssimo mais espertos que os peixes. Têm intelecto, idioma e clareza de tudo. Informação é o que não falta hoje em dia.
Antigamente, até poderia ser o caso de um camponês ignorante desconhecer fatos básicos da vida. Seu conhecimento era restrito só ao próprio círculo – o máximo a que chegavam seus passos e suas relações sociais, no caso, família e amigos, tão ignorantes quanto ele.
Mas, hoje, ah, hoje nem precisamos mais do papel impresso para saber todas as coisas. Está tudo aí, o tempo todo, ao alcance dos dedos. Inclusive há uns algoritmos muito espertos que seguem nos enviando as coisas que mais gostamos de ver, até estarmos completamente imersos.
Epa! Como é? Estamos rodeados de quê, mesmo?
As bolhas de autoafirmação estão mais poderosas do que nunca. Além de não enxergarmos a água, os inocentes, agora, estamos convencidos de que ela nem existe. E nela seguimos nadando.
Bom dia a todos. E como vai a água hoje?
Ana Maria Leal Salvador Vilanova
Engenheira civil, cinéfila, ailurófila e adepta da caminhada nórdica
AnaMariaLSVilanova@gmail.com
