Tênis é um esporte de estratégia, dizem os entendidos no assunto. Além de talento, técnica e muito treino, cada jogador estuda o adversário quase à obsessão. E o tenista André Agassi bem que precisava de uma estratégia, já que não conseguia ganhar do adversário Boris Becker, sendo essa uma das rivalidades memoráveis dos anos 80 e 90.
Disciplinado, foi para casa e estudou o colega, principalmente seu saque, matador. De fato, conseguiu divisar algo. Becker tinha um tique muito característico. Logo antes de cada saque, inconscientemente, mostrava a ponta da língua. E, dependendo da posição em que esta vinha, a direção em que mandava a bola seguia uma regra geral. Informação de ouro.
Das próximas onze partidas que jogaram, Agassi venceu nove, usando, além de todo o seu preparo, essa pequena, mas crucial informação.
O tempo passou, Becker se aposentou e deixou a competição profissional. E foi nessa época que se viram os dois, juntos, tomando uma cerveja, contando histórias de guerra. Só aí, Agassi comentou, quase casualmente: “Ei, sabe que você faz uma coisa assim com a sua língua antes de sacar?”.
Becker quase caiu da cadeira, estupefato. Disse que, depois de cada jogo, ia para casa e comentava com a mulher: “Parece que ele consegue ler minha mente!”. E completou: “Não sabia que você estava apenas ‘lendo’ minha língua.”
Agassi diz que, depois de identificar o tique, o mais difícil foi se conter para não utilizar essa informação o tempo todo. Se Becker desconfiasse, obviamente daria um jeito de controlar a mania e Agassi perderia a vantagem.
No meio disso tudo, a plateia via apenas dois tenistas jogando. Claro que peritos de poltrona tinham, como sempre têm, opiniões mil e conseguem ganhar centenas de partidas que nunca jogam. O fato é que ninguém falou sobre isso, o que teria, evidentemente, levado à correção por parte de Becker.
Essa pequena história é excelente para pensar no quanto vemos e, humildemente, no universo que não vemos em cada situação. Para cada pedaço de informação lá fora, uma infinidade desconhecida, até para os participantes, está em marcha, e o que parece um confronto perdido ou ganho, com um pequeno ajuste, muda. Que vença o melhor homem.
Ana Maria Leal Salvador Vilanova
Engenheira civil, cinéfila, ailurófila e adepta da caminhada nórdica
AnaMariaLSVilanova@gmail.com