Num programa de televisão, o tema era fraudes virtuais. Basicamente, pessoas que são enganadas via computador. Os tipos variavam, desde algumas puramente financeiras, até as mais comuns, com promessas de relacionamentos sérios, romance sem fim. Melhor seria dizer “problemas sem fim”.
Com a popularização do documentário “O Impostor do Tinder” (Netflix, 2022), fica a constatação de que evoluem os meios, porém a capacidade do ser humano de enganar e ser enganado segue firme e forte.
Há duas décadas, naquele programa de televisão, uma senhora comentava sua tristeza por nunca haver encontrado pessoalmente o amor da vida dela, apenas tendo se correspondido com ele por correio eletrônico. A equipe do programa, além de ouvir o lado dela, buscou a fonte das tais mensagens tão apaixonadas, para chegar a uma rede de escroques internacionais, que dedicam 100% do tempo a, primeiramente, envolver e, depois, sugar até o último centavo de vítimas ao redor do mundo.
O mais estranho, mesmo com as provas ali à sua frente: ela não desistia do sonho. Mesmo com a presença do representante da Nigéria dizendo, sem meios-termos, que tal pessoa não existia. Mesmo com a manifestação do ator cuja imagem usaram para criar o personagem perfeito. Mesmo com documentos, vídeos, fatos enfim, ela não se descaía. Muito, mas a muito custo, a certo ponto, aceitou que, talvez, as coisas não fossem como ela pensava.
O filho, na plateia, empalideceu quando ouviu quanto das economias da família ela havia enviado aos burlões. Nada a fazer; a possibilidade de recuperar sequer parte do valor no país distante era praticamente nula.
Decorridos alguns segmentos do programa, com outros casos sendo apresentados, voltamos à senhora, a verificar como estava ela lidando com o massacre de realidade.
Tendo tido um tempo de reflexão, ela reconstruiu, mais uma vez, a realidade, contrapondo todos os fatos com pseudoexplicações supercomplicadas, justificando todos os pontos da sua crença e voltando ao estado de autoilusão prazerosa.
Quando perguntaram ao grande intelectual Thomas Sowell por que ele desistiu do comunismo juvenil, ele respondeu com uma palavra: “fatos”. Afinal, somente fatos não são suficientes. Fatos mais coragem é que fazem a mágica.
Ana Maria Leal Salvador Vilanova
Engenheira civil, cinéfila, ailurófila e adepta da caminhada nórdica
AnaMariaLSVilanova@gmail.com