Em meados dos anos 90, uma série de televisão focada no ambiente hospitalar veio mudar a linguagem da categoria. Conhecida no Brasil como Plantão Médico, o centro de cada episódio era a Sala de Trauma, no setor de urgências de um movimentado hospital, explicando o nome original em inglês ER (Emergency Room).
No nascimento da Era de Ouro da TV, que hoje vivemos, tal série trouxe temas controversos, atores de primeira linha, movimentos de câmera típicos de cinema, edição dinâmica, tramas complexas e construção de personagens sólida e implacável. Ainda merece ser revisitada, especialmente as primeiras temporadas, que até hoje conservam o frescor do ineditismo. As últimas estabeleceram o padrão atualmente mais associado à Anatomia de Grey, desde o estilo meio dramalhão até o minivideoclipe quase ao final de cada episódio.
Para quem não é profissional de Saúde, não impactam tanto as mudanças no conteúdo técnico, porém, surpreende ver como o mundo se transformou em tão pouco tempo. Na série, todos os médicos têm um pager, aparelho popularíssimo à época, porque não existiam celulares comerciais. Um personagem endinheirado é o primeiro a trazer a novidade ao hospital e nem adianta muito, o sinal é fraco, funciona mal.
Durante uma operação de transplante, as duas equipes de cirurgia, que trabalham no doador e no receptor em salas contíguas, podem, pela primeira vez, falar-se via intercomunicador, evitando a necessidade de ter uma pessoa indo de uma sala a outra para levar e trazer informação básica. Os resultados de todos os exames saem em papel e têm que ser levados e buscados por alguém, atrasando procedimentos. Tradutores têm que ser trazidos regularmente para a comunicação básica e, se não chegam, o médico não sabe se a criança tem ou não alergias ou que vacinas tomou. Tudo isso hoje resolvido com um aparelho pequenino, quase onipresente.
O que faz uma obra com conteúdo desatualizado ser ainda tão atrativa? Os dramas humanos seguem atuais. Histórias bem contadas, sobre conflitos universais, sempre vão ser capazes de despertar o interesse e manter a atenção por muito tempo. Ver médicos e pacientes debatendo-se com situações difíceis, frequentemente impossíveis, conecta-nos com emoções básicas e nos faz refletir sobre nossas lutas atuais, assim como há tantos anos.
Ana Maria Leal Salvador Vilanova
Engenheira civil, cinéfila, ailurófila e adepta da caminhada nórdica. AnaMariaLSVilanova@gmail.com