Que triste tarde!
Tomei conhecimento de sua partida, meu amigo irmão.
A nossa cidade que vc tanto amou perde hoje o seu defensor.
Quis o cruel destino (maktub) que fosse vc acometido desse mal terrível, junto com Marilia, a filha que sempre esteve ao seu lado.
Internados os dois, ela foi embora antes, para enfeitar a sua chegada, ornamentando com abraços enternecidos o seu novo lar.
Felizmente, quis a sorte benfazeja que ela foi sem você saber, para a surpresa de abraçá-lo na chegada.
Você foi a voz de Uberaba, com seus arroubos de amor e a sua lembrança viva em seus escritos, onde se lia como se fosse ao vivo e a cores, personagens que por essas ruas perambulavam, hoje e antigamente, ressuscitados por sua memória prodigiosa.
Lembro-me do seu início, na antiga igrejinha de São Benedito, no serviço de alto-falantes na praça da velha rodoviária.
Era você e o Vicente de Paula Oliveira (o maior declamador de Catulo da Paixão Cearense), sendo que o Vicente já se foi de há muito e estará também presente na sua chegada.
As quermesses com seus correios elegantes faziam a alegria do nosso povo.
Lembro-me de quando você leu o correio elegante de um poeta desconhecido, que, respondendo a uma gentil e linda senhorita, lascou: “eu quisera ser uma lágrima para em seus olhos nascer, por sua face correr, e em sua boca morrer”.
Você falou que o poeta casou e não mais fez versos!
Daí você foi galgando os degraus da trajetória iluminada que o traria até hoje, passando por rádio, televisão e jornais.
Quando quiseram, por motivos outros, mudar a data de nascimento de sua terra amada, o mundo veio abaixo.
Veio à tona uma sua faceta por nós desconhecida, a de um denodado e valente defensor do berço.
O brilhante lutador fez de sua pena espada e partiu para o confronto.
Essa peleja açodada pela peça teatral de Luigi Pirandello “ASSIM E SE LHE PARECE” iria chegar a lugar nenhum, mas ficou no limbo para ser interpretada de acordo com a ideologia ou conveniência de cada um.
Você, Gonzaga, foi um grande amigo e ser amigo é muito difícil, e a gente, quando encontra um, tem que dar valor, e, quando estamos juntos, jamais dar motivos para sair da roda e ir embora, e você se foi.
Mas esse adeus, provocado por essa maldita síndrome, não irá impedir um reencontro no andar de cima.
A nossa cumplicidade em somar tristezas e dividir alegrias com o nosso Botafogo expulsava os resquícios de quaisquer malsinados pensamentos de que um dia haveria essa dolorosa despedida.
A dor do amigo que perde um companheiro não é pouca.
As tardes no Filó para espancar a solidão e nunca acreditar que um dia haveria essa triste separação.
Disse-lhe eu, uma vez, que os personagens da terra que não eram ficção, e sim protagonistas viventes, como Dora Doida, Maria Boneca, Maria Carrapata, Coronel Delcides e Alicate, que se dizia filho de Heleno de Freitas do nosso Botafogo, poderiam ser figuras de um romance regional que nos levaria a viver de novo emoções passadas e vc à glória nacional na literatura, já que aqui vc é exponencial.
Você lutou para vencer a Covid, mas vencido fez uma cidade inteira chorar, e foi sem se despedir, mas deixou pra todos o testemunho de seu grande amor por UBERABA!
A Vania, com certeza, devia sentir-se enciumada por tanto amor à nossa Uberaba, mas ela tinha o coração nas alturas e jamais deixaria de incentivar tão extremada paixão pela nossa terra.
Terra que hoje se sentirá agradecida por servir de agasalho pro seu corpo frio.
O seu corpo, Gonzaga, hoje volta ao ventre amado, feliz pelo fruto tão produtivo em versos e prosas que você nos legou.
Nosso rincão amado jamais será o mesmo sem a presença pujante de sua pena-espada valente a nos defender.
Somos todos órfãos de sua presença física, mas temos a certeza inexorável de que você, onde estiver, com a força da experiência de vida que teve, jamais nos esquecerá na morte.
Siga com Deus, nobre MARQUÊS DO CASSU!
Walter Bruce da Fonseca