Será que somos saudosistas quando lembranças são guardadas em nossa mente ou porque recordações fazem parte do que somos?! Ninguém despreza a modernidade com seus smartphones, redes sociais, ferramentas que ultrapassam barreiras do tempo e espaço e nos permitem quebrar limitações do relógio e da geografia. Mas, em meio a essa conexão virtual constante, surge uma questão importante: como fica a reconexão com o mundo real?
A presença física, os abraços, o olhar nos olhos e as conversas sem distrações ainda são insubstituíveis. Enquanto navegamos nesse mar digital, será que não deixaremos o barco da convivência presencial à deriva? Com um simples toque no iPhone nos conectamos com filhos em outros países ou amigas de infância. Como equilibrar isso?
A tecnologia nos deu tudo ao alcance de nossas mãos, mas somos infinitos nas conexões humanas. Somos sobreviventes de uma época em que íamos almoçar ou fazer visitas sem programar, papos com vizinhos nos passeios sem preocupação com assaltos.
Lembranças inesquecíveis dos almoços e lanches no casarão do primo Abel Reis, onde sempre íamos acompanhar a prima literata, poetisa Eva Reis de Sousa. Antes, eu e Ani íamos à sua chácara coberta de eucaliptos, cheiro de madeira, o som do vento, o aroma da natureza, as mãos cobertas de lichia, presentes da prima. Depois nos dirigíamos ao casarão, cujo ambiente não era apenas arte, mas também vida. Conversas descontraídas fluíam naturalmente, um verdadeiro contraste com o ritmo acelerado do mundo atual. Hoje, todos podem visitar o Museu de Arte Decorativa (MADA). É bom saber que esse espaço, que foi tão nosso, agora pertence à memória coletiva da cidade.
Somos sobreviventes de duas gerações: a que aprendeu a se maravilhar com o toque humano e a que descobriu o poder da era digital. Nós, dos 50 aos 100 anos, presenciamos a transição veloz de um mundo analógico para um universo virtual.
Olhando para trás, somos de uma época em que íamos, por vontade própria, à casa dos avós, a qualquer hora, pentear os cabelos da vovó Lilica, branquinhos, presos num coque, comer o bolo de fubá com café, vendo o vovô Nicanor no jardim ou lendo um livro. Saíamos alegres e felizes sem presentes, mas com uma sensação de que éramos queridas e amadas. Eram lições de convivência, de respeito mútuo, uma riqueza da qual os toques das telas nos distanciam.
O desafio é justamente cultivar essa presença. Um brinde à ironia deste mundo moderno, onde podemos ter acesso a tudo, menos àquilo que realmente importa, a conexão óbvia entre as pessoas de verdade. Nossa formidável tecnologia não substitui o calor de um sorriso espontâneo, o som de uma risada compartilhada ou a magia de uma presença que nos toca.
Diante da realidade de um universo freneticamente conectado, é importante lembrar que a alma não viaja em cabos de fibra óptica, ela se nutre de abraços demorados, de risos ecoando em qualquer lugar que seja, de mãos dadas em silêncio durante momentos difíceis.
O equilíbrio, hoje, consiste em estar presente e coexistir com a tecnologia.
Dois beijos...