Não é de estranhar que, às vezes, perdemos a calma em situações que podem testar nossa paciência, diante de aproximações inoportunas que nos irritam. Para não dar um vexame em público e piorar a situação, a gente mantém a calma, o que requer uma habilidade poderosa.
No encerramento da festa da Medalha Milagrosa, em Uberaba, fomos à missa e fui encarregada de uma missão importante: garantir um bom lugar para as amigas. Lá fui eu para o salão paroquial antes de terminar a celebração.
Coloquei quatro cadeiras sobrepostas e uma para colocar as bolsas, salão cheio e olhar de reprovação dos participantes diante do meu ato. De repente, acabei atraindo a atenção de alguém que, definitivamente, não estava no mesmo clima de festa. A sensação de atrair pessoas em estado alterado, alcoólatras ou outras substâncias, é inevitável, mesmo estando de costas. É como se eu tivesse um ímã para esse tipo de pessoas. Misericórdia!
“Oi, prima! Posso sentar ao seu lado?” Já que estava sozinha, escolhi o diálogo e a história rendeu. O rapaz não parava de falar de nossos laços familiares. Pedi ao garçom cerveja e um tira-gosto e enchi os nossos copos. Mesmo não sendo terapeuta, senti seu estado feliz por eu o estar ouvindo. A missa não acabava e eu continuei oferecendo-lhe um pouco de dignidade e humanidade que ele precisava no momento. Seria verdade o que falava ou era apenas um maluco total? Ouvia com atenção, em silêncio, com “hum! Hum! Hum!”. Finalmente, as amigas chegaram. Ave Maria!
O “primo”, no entanto, não queria ir embora. Aquele afastamento foi de grande comoção, e os seguranças o levaram. Todas as amigas se acomodaram. De outra mesa, uma amiga que presenciou o acontecimento me parabenizou pela postura de escuta, ouvindo o rapaz falante por quase meia hora e até oferecendo bebida a ele.
Nesse dia, jogando bingo, ganhei uma bicicleta. Senti que foi uma forma de Nossa Senhora demonstrar sua atenção, considerando minha conexão com a espiritualidade e dedicação ao ouvir aquele rapaz. Acredito que veio como um sinal de gratidão pelo meu ato de bondade!
Essas pequenas coincidências muitas vezes acontecem. Ao praticarmos o bem, o universo responde de forma inesperada. Escutar é um exercício que precisamos reaprender.
Vivemos em uma sociedade em que o imediatismo e a superficialidade imperam. Ouvir os filhos, companheiros, amigos, o evangelho com atenção, torna-se um ato de resistência nos dias de hoje. É algo que exige escuta e ninguém tem paciência.
Quando Ani foi coordenadora da Creche A Pequena Casa de Maria, um rapaz apareceu com humildade e pediu se podia ficar ajudando com as crianças. Bem-vestido, com aparência de uns 28 anos, ia todas as tardes assistir às aulas e conversar com ela. O jovem de voz enrolada, “fora do ar”, queria estar ajudando no que precisasse. Era lá com Ani, colocando brinquedos nos lugares, rindo e rodopiando com as crianças, que ele passava os dias.
Ela ouvia suas palavras com atenção. Mais tarde, contaram que o rapaz foi submetido a “lobotomia” para cura de seus surtos, epilepsia, agressões graves aos pais. Filho de médico, foi a única solução encontrada. Quem somos nós para julgar os atos do ser humano? Passou a ser calmo, amigável. Ani o ouvia com tolerância, mesmo com sua dificuldade em falar.
A habilidade de ouvir é tão essencial quanto a de se expressar bem, mas muitas vezes é esquecida. A todo momento há oferta de cursos de oratória, que deveriam vir juntos com escutatória. Quantas vezes somos interrompidos antes de completar nosso pensamento!
Em muitas situações recebemos aquela ligação da amiga que quer desabafar, justamente quando estamos assistindo ao nosso programa preferido, o que se torna um dilema.
Respire fundo e lembre-se de que nosso papel, neste momento, é escutar e apoiar, e não resolver o problema. Por outro lado, também há ocasiões em que nós mesmos precisamos desse apoio. A vida é desafiadora e nem sempre temos alguém que pare para nos escutar quando mais precisamos.
A falta de paciência em ouvir o outro, por pressa, ansiedade, descaso ou até mesmo pela inabilidade de praticar a escuta, pode criar um ambiente de tensão e dificultar o diálogo. É necessário manter uma comunicação saudável, o que é um desafio, mas com tolerância podemos melhorar.
Vamos reaprender a escutar. Nosso blá-blá-blá, em certos momentos, não é a solução.
Dois beijos...