ARTICULISTA

Tsunami prateado

Ani e Iná
Publicado em 18/11/2025 às 21:43
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Este ano, o tema da redação do ENEM foi: “Perspectivas acerca do envelhecimento na sociedade brasileira”. Todos nós sabemos que envelhecer é um privilégio em uma sociedade que exalta a estética e a juventude. No Brasil, a velhice é cercada de desafios.

Quando viajamos para países como Canadá, Inglaterra ou Estados Unidos, algo nos chama a atenção, e não são apenas as ruas limpas, os prédios imponentes ou os parques bem cuidados: é o respeito silencioso com que tratam os cabelos prateados que cruzam o caminho.

Lá, os idosos caminham em grupos pelos shoppings, conversam em cafés, sorriem. Eles têm suas “casas-lar”, mantidas pelo governo, onde atuam profissionais atentos. O objetivo é simples, porém grandioso: preservar a autonomia e a dignidade de quem já construiu tanto.

Nesses países, a velhice tem espaço para descanso e reconhecimento. Há atividades diárias, equipamentos de autoajuda e incentivo à independência.

Aqui, no Brasil, a realidade é outra. Envelhecer ainda é visto como um peso. As clínicas particulares para idosos são caras demais, quase um luxo. Muitos dos nossos veteranos, cansados e cheios de histórias, acabam vivendo à sombra da compaixão alheia, suportando favores em casas de filhos ou parentes que perderam o dom da ternura – ou isolados em um asilo.

Em contrapartida, lá fora a velhice passeia de mãos dadas com a liberdade; aqui, ela ainda espera por um pouco de respeito e um lar que a acolha sem piedade, mas com amor.

Quem não teve ou nunca terá um “demente” na família? O envelhecimento, embora inevitável, revela-se de formas diversas em cada pessoa e em cada história. Na sociedade brasileira, há um olhar misto entre falta de respeito, negligência e incompreensão diante da velhice. Entre lembranças e afetos, percebo como o tempo transforma não apenas o corpo, mas a essência de quem o vive.

Em minha família materna, dos Bittencourt, não houve sinais de esquecimento, mas uma velhice vivida em plenitude.

Já os avós paternos tiveram destinos diferentes. A vovó Lilica envelheceu com doçura: cuidava de seu jardim florido como quem zela por um pedacinho do céu. A bisavó Mariquinha, porém, caducou. Sua presença silenciosa na cadeira de rodas nos assustava quando éramos crianças. O Alzheimer foi apagando pouco a pouco sua identidade, até que restasse apenas o vazio, como se alguém tivesse apagado a luz. Voltávamos das visitas com a boca amarga, incapazes de compreender aquele silêncio e aquele olhar distante.

É um estágio de sofrimento não só para quem envelhece, mas também para os familiares. Haja recursos para custear cuidadores! O que deveria ser política pública fica por conta de entidades filantrópicas, como caridade. A ostentação e os espetáculos em Brasília deixam as promessas de campanha esquecidas, anestesiam nossos idosos carentes em suas instituições. Tudo o que um idoso precisa tem que ser comprado, ou chega como esmola de uma pessoa de boa alma.

Vivemos em um país despreparado, que envelhece antes de enriquecer. Isso representa um desafio diante do chamado “tsunami prateado”. Você já pensou nisso? Temos preparado nosso corpo e nossa mente para o envelhecer? Yoga, natação, hidroginástica, pilates, caminhadas... Precisamos movimentar o corpo e o espírito para que a velhice seja vivida, e não apenas suportada.

Afinal, não é apenas acumular anos, mas compreender que a vida é feita de luzes que se acendem e se apagam.

Vivemos em um país que empobrece e desrespeita os idosos, onde a aposentadoria é violada e faltam políticas públicas de cuidado para os aposentados. Cabe a nós agir em defesa de nossa própria velhice com consciência, solidariedade e amor.

Dois beijos...

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