ARAHILDA GOMES

No silêncio das mães

Arahilda Gomes Alves
Publicado em 06/05/2023 às 18:49
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Maio se esvai, mas não carregando um só domingo na homenagem às mães. Lembradas todos os dias e marcantes neste mês, cheio de bênçãos.

Mães, ouçam toques em clarinadas nas muitas noites, aquartelados universalmente, nos corações, nas solenidades fúnebres em modulações lúgubres, belos, porém. Toques do silêncio chamam à meditação, à saudade, às lágrimas. Apelam à sensibilidade em gotas silenciosas. E podem crescer, nas muitas notas dedilhadas de uma harpa acompanhando sua trajetória. Vêm gotejantes, em “fermata”, nos “tutti orquestra”, harmoniosas como a espicharem na dor corações irmanados no sofrimento.

Mães, ouçam a Ave-Maria ao toque das seis badaladas dos sinos de bronze e orem por nós, seus filhos, pedindo colo.

Mães, contritas, ouçam vozes angelicais, pinceladas no azul sereno, chamando a primeira estrela vésper jorrando luz na transparência de suas constelações.

Mães, espalhem bênçãos aos que mourejam, riem, choram e amam.

Mães, acordem filhos embalados na manjedoura-berço e cantem acalantos, dancem marchas, rodopiem valsas, cantem canções em regulares ritmos, acoplando-os ao universo, saneando-o das mazelas do mundo.

Mães, “estalem dedos”, acariciem o atingível na ação contemplativa do viver e do reviver, acordando filhos para o amanhã de vários arrebóis.

Mães, orem pelos filhos do mundo: injuriados, caluniados, difamados, desprezados e injustiçados, asfixiados por gases venenosos, queimados vivos nas boates, em meio às comemorações de mais uma vitória, torturados pelas mãos fortes e cabeças de homens vazios de ternura, cegos do poder.

Mães, em vigília, rezem no silêncio da noite, implorando amor aos muitos filhos doentes gerados fora do amor e jogados na lixeira da sociedade.

Mães silenciosas, que nas muitas tardes mornas cosem em gestos abundantes, no odor de parcas flores, hastes envergadas dos filhos tortos, frágeis de corpo e alma, mas de desejos e imagens fortes, atando-lhes laços de afeto. E a cozer acepipes suculentos, saciem-lhes desejos inconfessáveis de sabores.

Mães viúvas, a se tornarem metade ferro, metade coração, chorem os muitos filhos mortos, presos em medalhas oxidadas em campos de batalha, nas muitas lutas, no cumprimento do dever, rastreados nos sonhos de um ideal.

Mães, orem os filhos perdidos nas noites de orgias, no esconderijo das drogas, nas vestes de andarilhos errantes, nas lamas dos latrocínios, nas enxurradas dos muitos disfarces da corrupção.

Mães, chorem lágrimas silenciosas, nas muitas visitas às lápides frias de uma saudade de nova dimensão reduzida em nove meses de ansiedade, de filhos natimortos.

Mães, cabelos brancos, enciclopédias de uma vida desfigurada nas folhas do tempo, pinceladas implacáveis de rugas sem rusgas, na cadência de coração de grandes moradas, como a do Pai Celeste. É Ele a lhes preparar a chegada, ao toque de clarinadas do silêncio, arma secreta de uma paz ousada na terra, sem percepção, porém. Será Ele, Mães, a configurar, na eloquência dos seus incontáveis silêncios, às que somos e às que serão mães audição solene, no ruflar de asas angelicais, incessantes aplausos à verdade e à justiça, à coragem e à solidariedade, ao sonho e ao ideal, atos sublimes de gerar um universo de paz no abraço acolhedor do sorriso de Deus!

Arahilda Gomes Alves

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