A Igreja Católica no Brasil, mesmo recebendo muitas críticas desleais, é uma entidade religiosa preocupada com a identidade espiritual das pessoas, mas também a vida em sua total dignidade. Justamente por isto que, a partir de 1962, vem realizando, todo ano, a Campanha da Fraternidade. Seu objetivo ultrapassa os limites da instituição para contribuir com o bem espiritual e social das pessoas.
Muitas dessas campanhas têm uma conotação realmente social, quase como contrapartida em relação a uma cultura que não valoriza os brasileiros como tais. A Igreja procura chegar junto para ajudar na reflexão do povo. É o que acontece neste ano de 2023, com o tema “Fraternidade e Fome”, num momento em que a fome no país tem chegado a patamares muito preocupantes.
A oração da Quaresma precisa se transformar em ação para diminuir o sofrimento de tantas pessoas. Estamos diante de um desafio, quando o lema bíblico diz: “Dai-lhes voz mesmos de comer” (Mt 14,16). E o Brasil tem condição de sarar essa ferida angustiante da fome, usando os próprios recursos. A Campanha da Fraternidade não resolve o problema, mas é espaço de reflexão sobre o tema.
O ser humano é “ser vivente”, que depende da natureza, da fertilidade do “Jardim do Éden” (cf. Gn 2,7-8), onde deve existir fartura de alimento e o necessário para a sobrevivência. Ninguém deveria morrer de fome e nem passar fome em terras brasileiras com tantos recursos naturais e capacidade humana para o trabalho. A Campanha quer mostrar que alguma coisa está errada neste cenário.
É interessante uma frase bíblica que diz: “A transgressão de um só levou a multidão humana à morte” (Rm 5,15). O problema da fome no Brasil não seria fruto de transgressões e de pouca visão social e fraterna de muitos? Não é por falta de alimento, porque o país é privilegiado no setor da agricultura. Talvez a culpa, se assim podemos dizer, não estaria numa política mal gerida?
Diz que Jesus “jejuou durante quarenta dias e quarenta noites, e, depois disso, teve fome” (Mt 4,2). Muitos brasileiros jejuam muito mais, chegando até morrer por isso. É uma das realidades que precisam sensibilizar a todos, porque o direito à vida não pode ser privilégio de uns em detrimento de outros. Por isto, a Campanha da Fraternidade quer provocar a capacidade da partilha fraterna.
Dom Paulo Mendes Peixoto
Arcebispo de Uberaba