Ó abre alas/Que ele quer passar/Ó abre alas/Que ele quer passar(...)
Às vésperas de mais um carnaval, nada mais oportuno que recitar os versos da marchinha Ó abre alas, da grandiosa Chiquinha Gonzaga. Só que neste caso subvertemos a canção para discutir o episódio polêmico encenado por Roberto Alvim, até então secretário da Cultura.
Desculpe-me à memória da compositora! Por favor, a intenção não é desrespeitar um clássico do cancioneiro nacional. Aproveito para deixar claro meu profundo respeito pela história cultural de nosso país. É que dessa vez a presepada vinda de Brasília foi tão apoteótica que não resisti ao sarcasmo.
Tudo começou quando o secretário protagonizou um vídeo, cujo discurso e cenário fazem referência explícita a uma propaganda nazista, datada de 1933. Gente, estou até agora tentando compreender a escolha. Qual o propósito de reproduzir uma cena de um dos maiores genocidas do mundo? Soberba? Ignorância? Valores duvidosos? Foi, no mínimo, uma tremenda falta de noção. Ainda se fosse algo espontâneo, até daria para sair pela tangente, mas, quando se trata de uma ação minuciosamente calculada, não haveria pedidos de desculpas que remediassem a confusão.
Penso que ele já apresentava sinais de despreparo para assumir um desafio de tamanha importância. Quem não se lembra dos ataques à atriz Fernanda Montenegro? O acontecimento causou revolta da classe artística, especialmente por ferir a dama da dramaturgia de forma gratuita. Isso ocorreu uns dois meses antes de ocupar o cargo na secretaria, o que me leva a identificar um talento do nosso protagonista: habilidade para causar polêmicas. Arrisco até dizer que este é o denominador comum entre os dirigentes atuais do país. Será?
Vou até aproveitar para fazer um paralelo entre o vanguardismo de Chiquinha Gonzaga e a passagem meteórica do ex-secretário. Enquanto a primeira derrubou imensas muralhas machistas para conquistar seu espaço; o outro foi afastado de seu posto em meio a um evento anacrônico, trazendo à tona “fantasmas” que queremos deixar guardados num passado distante. Se não fosse realidade, seria uma grande comédia hilariante. Só que não.
Mas, afinal, por que escolhi a mais famosa marchinha de todos os tempos? Com a “queda” de Alvim, somam à lista de demitidos: três ministros, dezenas de secretários e alguns diretores. Diante desses fatos, podemos eleger Ó abre alas como a trilha sonora do primeiro ano de mandato presidencial. Você concorda comigo, caro leitor?
Estou até imaginando que o acontecimento desastroso antecipou as festividades de rua, afinal, aqui não é a terra do carnaval?! Como o desfecho foi muito sem graça, acho que vou enviar a seguinte sugestão ao todo poderoso do Palácio do Planalto e sua equipe: criar grupos de foliões vestidos com máscaras do rosto de Roberto Alvim dançando ao som da marchinha. Isso sim seria um desfecho à la Brasil!
Euseli dos Santos
Advogado militante em Uberaba