ILCÉA BORBA MARQUEZ

A Casa dos Espíritos

Ilcéa Borba Marquez
Publicado em 31/01/2023 às 19:22
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Vou iniciar minhas reflexões sobre essa obra de Isabel Allende pela fala da personagem central Clara Trueba: “Uma vida é um tempo muito breve. Tudo acontece tão rápido que não dá tempo de entender a relação entre os acontecimentos.” (trecho extraído do “Diário de Clara Trueba”)

Ao focar o feminino nesta obra, destaco Nivea, Clara, Branca, Alba e Férula – cinco personagens para abranger a questão feminina em sua complexidade. A primeira questão é dada na escolha dos nomes: Nivea, Clara, Branca e Alba – sinônimos do Branco, lembrando que Nivea significa neve – gerações seguidas de mulheres –, avó, mãe, filha e neta. Estas, em especial Clara, de acordo com as cenas do filme de mesmo nome, estão sempre vestindo roupas leves, esvoaçantes e claras, bem de acordo com a borboleta em seu voo suave e rápido. Como contraponto, Férula apresenta-se vestindo preto, pesado e rigoroso, tendo na cintura as chaves da casa. É a personificação do controle disciplinador – uma personagem estranha, amarga, fria e pesada, escondida nas sombras. Ela está em evidente oposição às outras mulheres: branco e preto, contrapontos que se revelam pela oposição – leve e alegre, outra, pesada, repressora e imobilizada. Se as primeiras trazem alegria, a segunda restringe e amarga a trama.

Enquanto cor, o branco pode se situar nas duas extremidades da gama cromática. Ela significa ora a ausência, ora a soma das cores. O branco é um valor limite, assim como as duas extremidades da linha infinita do horizonte. É também uma cor de passagem – morte e renascimento, oeste e leste. O branco traz em si a possibilidade de todas as cores. O branco produz em nós o mesmo efeito do silêncio absoluto. Este silêncio não está morto, pois transborda de possibilidades vivas. É um nada pleno de alegria juvenil, ou melhor, um nada anterior a todo nascimento, anterior a todo começo. Neste enredo dramático a personagem Clara passa longos anos em silêncio absoluto ao mesmo tempo que sua fala se distingue pelo desrespeito constante aos limites de tempo e espaço. Ela fala do agora, do ontem e do amanhã, do aqui e do além.

Um segundo registro de Clara no seu diário é: “a graça não estava em morrer, porque isso aconteceria de qualquer forma, mas sim em sobreviver, o que era um milagre.” É uma clara definição da capacidade de adaptação feminina aos percalços da vida entrelaçada a um homem extremamente conservador numa história política em ebulição, sendo cada uma das mulheres forte e revolucionária, que, por sua vez, propõe mudanças sociais significativas, defendendo amar uma pessoa, da sua própria família, que pensa e luta totalmente diferente de você própria.

 Ilcea Borba Marquez

Psicóloga e psicanalista

e-mail: ilceaborba@gmail.com

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