Mulher fala muito, fala pelos cotovelos. Fala com o corpo, percebeu, genialmente, Freud ao escutar suas histéricas. Sua fala corporal manifesta a emoção impedida de ser exteriorizada. Os movimentos tônicos e clônicos do seu corpo em “crise” expressam os afetos sem palavras que a educação repressiva lhe impõe.
Mulher fala do corpo também. Mas não fala em qualquer lugar. A fala da mulher tem um código própri ela é íntima num duplo sentido. Mulher fala de coisas íntimas em lugares íntimos. O espaço que lhe é próprio é o espaço privado e seu texto é relacional. A fala feminina acontece na intimidade da vida a dois, na relação afetiva/familiar, no espaço privado criado pelos limites do “lar”, da vida em relação.
Mas falar assim da mulher não será, tão somente, referendar uma construção cultural estereotipada do feminino? Afinal, as mulheres avançaram muito nas últimas décadas, a ponto de se tornarem, neste final de milênio, o perfil cultural com maior índice de mudanças. As mulheres conquistaram voz e voto em território culturalmente masculino. Temos mulheres cientistas, políticas e até mesmo militares... As mulheres avançaram... Na verdade, o “avanço” das mulheres no espaço público se deu por uma exigência social. Sociedade empobrecida pelos esforços de guerras, que lhe exigiu trabalho igual ao dos homens, marcando a diferença nos salários menores.
As mulheres avançam no espaço público, é verdade, mas em linha quebrada. Seu sentimento é de atração e repulsão por esta invasão num campo tradicionalmente masculino. É uma espécie de apropriação indébita marcada por uma insegurança. A mulher se sente estrangeira neste território, duvidando sempre de sua capacidade, sentindo-se culpada pelo abandono de seus tradicionais papéis, temendo que o preço a pagar seja alto demais: as mulheres sabidas são temidas e não amadas pelos homens. A relação da mulher com o saber, identificado com o masculino, é ambígua.
A fala em situação pública parece significar, para as mulheres, uma mudança de registro linguístico em que a comunicação informal de sujeito a sujeito, inerente ao espaço privado, cede lugar a outro registro conceptual, masculino, vivido não só como diferente, mas como superior à linguagem feminina e mais adequado às exigências do espaço público.
A fala feminina caracteriza-se pela possibilidade de veicular o afeto. Desde o início, quando de sua relação com o infans - aquele que não detém a palavra -, ela inscreve/escreve em seu corpo o alfabeto erógeno, organizando e estruturando o devir da criança. É a mãe que, seduzindo o corpo do bebê, o introduz no humano. Ela lhe diz: “Tu és o único, nem o mais, nem o menos importante, porque és absoluto”. Tudo que o bebê pode desejar é ser tudo para a mãe. Ele se sente seu Senhor...