ARTICULISTAS

A lição de Helen Keller

Anne Sullivan e Helen Keller estarão sempre unidas

Ilcéa Borba Marquez
ilcea@terra.com.br
Publicado em 29/08/2012 às 19:58Atualizado em 19/12/2022 às 17:41
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Anne Sullivan e Helen Keller estarão sempre unidas na experiência ímpar de suas vidas: a primeira como “Professora Extraordinária” e a segunda como “Aluna Prodígio”. Graças ao esforço e dedicação total de uma vida, Anne conseguiu devolver ao convívio humano sua aluna Helen, portadora de graves deficiências físicas – cegueira e surdez total agravadas pelo mutismo parcial. Durante certo tempo do tratamento, Anne precisou afastar Helen do convívio familiar altamente intrusivo, forçando-a a viver dia e noite em sua companhia, o que resultou em uma experiência de total dependência da aluna em relação à sua professora, na oportunidade única pessoa a satisfazer todas as suas necessidades.

A própria Anne fora quase cega, em consequência de uma doença na infância. Sua condição posterior se deveu ao trabalho do diretor do Instituto Perkins para Cegos em Boston – Michael Anagnos, de quem teve sérias dificuldades de se separar ao fim do seu próprio processo de aprendizagem e cura. Assim, encarnou muito bem a situação dolorosa do se tornar independente do seu criador, rompendo o par fusionado – criador/criatura.

Bettelheim selecionou um velho provérbio chinês: aquele que salva uma vida passa a ser devedor à pessoa a quem salvou; não mencionando por demais óbvio que a pessoa salva deve a vida ao salvador ao comentar o relacionamento verdadeiramente simbiótico entre Helen e Anne. Esta, enquanto professora excepcional de uma só aluna, tornara a vida de Helen possível e suportável. Quanto mais ciosamente Anne se apegava à sua criação, tanto mais se escravizava às exigências que esta fazia.

Helen também se encontrava aprisionada à fusão com Helen, revelada nos dizeres de Will Cressy (colunista do New York Star) quando comparou sua situação como alguém que permanecesse sentada numa cela de aço invisível (completa escuridão e absoluto silêncio) em estado visivelmente ansioso, procurando a todo instante estabelecer contato com o mundo através do seu único interlocutor - a Professora -, cujas mãos e lábios eram continuamente tocados na angústia expectante de respostas ou informações sobre alguma conversa e/ou percepção. Seu sofrimento era evidente, no entanto, só muito tarde na vida ela revelasse: os feridos de morte devem se empenhar em viver seus dias com alegria para o bem dos outros. Através de Helen, o mundo acreditava na ilusão de que se pode ter uma vida plena e feliz, embora sendo cego e surdo.

Que esta lição sirva de alerta aos que agora desejam sancionar a lei de cotas universitárias!

(*) Psicóloga e psicanalista

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