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A mulher no mercado de troca

Não conseguimos ficar imunes ao sentimento de repúdio quando lemos sobre a Inglaterra do século XIV, mais precisamente no reinado de Henrique VIII e suas seis esposas.

Ilcéa Borba Marquez
ilcea@terra.com.br
Publicado em 03/08/2018 às 10:18Atualizado em 20/12/2022 às 15:23
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Não conseguimos ficar imunes ao sentimento de repúdio quando lemos sobre a Inglaterra do século XIV, mais precisamente no reinado de Henrique VIII e suas seis esposas. Conhecido como “Henrique, o sanguinário”, detentor de poder absoluto sobre seus súditos, tais com confisco de propriedades, determinação do que era herege ou ortodoxo em matéria religiosa, condenação à morte após julgamento simulado. Usou e abusou destes poderes degolando inúmeros súditos bem como três de suas seis esposas.

Só na casa Bolena requisitou as duas filhas, Maria e depois Ana, para a sua cama. Com o exemplo desastroso de sua irmã Maria, abandonada após o segundo filho bastardo, Ana exigiu casamento, título de rainha e legitimação para seus filhos, caso os tivesse, para depois se render aos assédios reais.

A leitura ou o acompanhamento das cenas dos filmes e seriados sobre este reinado choca pelos ultrajes feitos às mulheres: pais, maridos e irmãos as usavam como moeda de troca: eram dadas aos mais ricos e poderosos em troca de propriedades, ganhos ou cargos na corte. Tornavam-se objetos adornados ou lapidados porque então alcançavam maior valor e rendimentos à família.

Foi pensando assim que o pai de Maria e Ana Bolena enviou-as à França onde aprenderam as técnicas mais novas e refinadas de se conduzirem na cama dando maior prazer aos homens. No retorno de tal “especialização”, eram “coisas” valiosas disputadíssimas no mercado de leitos x pecúlios familiares.

Se o desejo sexual do rei por Ana deu início à cisma anglicana; a ambição de todos encapou e reforçou a separação oficial da tutela papal e a organização do luterismo. Diante da atitude irredutível da adolescente Ana negando-se a ceder aos assédios sexuais do rei antes do casamento e da legitimação dos seus filhos, Henrique VIII tentou junto ao Papa Clemente VII licença para casar-se com Ana sem desfazer seu casamento com Catarina, o que lhe foi negado por duas vezes.

Nesse momento, o astuto Tomás Cranmer descobre uma saída: pelas leis inglesas ninguém teria poder maior do que o rei! A partir de então foi um salve-se quem puder: cisma e morte por degolamento a todos que se opunham à vontade do rei. Como o Cristianismo estava presente na Inglaterra havia 12 séculos, existiam muitos bens a serem confiscados, muitas terras a serem distribuídas. Todos os homens foram beneficiados e a mulher Ana perdeu sua cabeça, tornando-se então animal de expiação!

(*) psicóloga e psicanalista

ilcea@terra.com.br

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