A síndrome da Tensão Pré-Menstrual surge em nossos dias como a síndrome da mulher moderna
A síndrome da Tensão Pré-Menstrual surge em nossos dias como a “síndrome da mulher moderna”. Marcando uma diferença sexual, cada vez mais difícil de ser simbolizada pelas mulheres de nossa época, os sintomas da STPM mostram-se incompreensíveis para suas vítimas, incuráveis para os médicos, “loucura feminina” para a sociedade.
Um quadro sintomático que abrange a ansiedade de um modo geral e até mesmo irritabilidade excessiva, sensibilidade exacerbada, pessimismo extremo, sentimento de fracasso, depressão, impulsividade, perda da capacidade de julgamento, bem como manifestações de ódio intenso; tudo desaparece como num passe de mágica, assim que acontece a menstruação. A vivência do período pré-menstrual dá lugar a um estado de extremo bem-estar psíquico, que se instala simultaneamente à presença da menstruação.
As queixas voltam a se rebater sobre o terreno das relações afetivas, justificando-se a partir da conduta do outro. O ódio ou a perda da racionalidade são sempre apontados, na fala das pacientes, como resultantes de uma falha no outro – no companheiro, que não as ouve; na mãe, que não as amou o bastante; em “alguém” que certamente poderia responder aos seus apelos, mas se recusa.
Notamos destas falas a ausência de qualquer referência à menstruação enquanto significante da função feminina da maternidade. Há questões que não são jamais colocadas espontaneamente, com o que é a tensão pré-menstrual? O que é isso para mim? Por que ovular me faz sofrer e menstruar me traz alívio?. As “mulheres da STPM” não falam sobre a menstruação nem sobre como a ovulação e a maternidade estão simbolizadas em seus códigos pessoais. Para elas, em primeira instância, a sigla responde pelo não sentido, explica sua própria estranheza, confere um nome para seu mal irremediável. A nomeação em sigla reduz a experiência como secreta, submetida a um código também secreto, que, como tal, deve permanecer: fala-se para não falar.
Como articular o real do corpo a um discurso onde o feminino não tem lugar?
Será esse um preço a ser pago pelas conquistas das mulheres no terreno da igualdade entre os sexos, depois de tantas reivindicações e lutas? As mulheres, hoje, podem ocupar os mesmos lugares que os homens, produzir como os jovens, fazer sexo como os homens, sem que nenhuma gravidez indesejada ou transtorno menstrual venha impedi-las em suas determinações. Podem decidir se querem ou não engravidar e quando fazê-lo. Podem mudar de ideia e abortar. Podem até decidir sobre uma eventual programação do ciclo menstrual. E, para aquelas que apresentarem alguma dificuldade na concepção, as técnicas de reprodução humana estarão prontamente disponíveis para lhes garantir êxito também nesse aspecto.
Marie-Claire Boons denuncia o engodo ao qual se articula esse movimento feminino pela disjunção entre sexualidade e reprodução – cuja palavra de ordem era, originalmente, “Meu corpo é meu” – e que “transfere o corpo das mulheres, que antes pertencia singularmente ao pai e ao marido, à instituição médico-científica, proprietária anônima, esfera de poder, de decisão, de conselhos, de prescrição”.
É na raiz desse sofrimento feminino, associado à menstruação – seja resultante de processos fisiológicos, seja devido aos seus efeitos psíquicos –, que devemos buscar as significações que lhe são particulares, também dentro de uma perspectiva histórica.