Ainda que ache sua companheira frívola, infiel, não especialmente inteligente nem linda, ele... a ama! Quais forças sustentam um amor que vai contra um ideal
Ainda que ache sua companheira frívola, infiel, não especialmente inteligente nem linda, ele... a ama! Quais forças sustentam um amor que vai contra um ideal, uma vez que sabemos da importância do processo idealizador na construção e manutenção de uma relação amorosa? Na tentativa de elucidar esta questão, dirigi minha atenção aos Amores Ilícitos.
Sob essa denominação de amores ilícitos me refiro às uniões desiguais, com diferença gritante de idade, diferenças raciais, nacionais, confessionais e, até mesmo, a homossexualidade enquanto relação associal – sem respaldo legal, constitucional e religioso – relações que se apresentam, normalmente, frágeis não por serem más, e sim porque estão à margem das normas sociais. A fragilidade existe, sobretudo porque tais relações significam uma revolta quase imperceptível, mas muito intensa contra o princípio de desempenho e uma luta pela liberdade do prazer, ou seja, aquela sensação de não-ser-forçado-por-ninguém ou de não-ser-obrigado-por-instituições. No entanto, uma atitude assim geralmente não é aceita nem pela sociedade nem pelo ideal do eu dos amantes: dentro dessas uniões, o sentimento de culpa em nível psicológico é cuidadosamente alimentado pela culpa social, que quase sempre funciona como fator de separação.
Esclarecend a vida amorosa adulta tem seus limites e possibilidades definidas já nos primeiros anos de desenvolvimento nas experiências primitivas e marcantes da criança com seus pais. Pensando sempre que o ser é anterior ao ter, ou seja, “ser alguém” antecede o “ter alguém”, as relações com os outros só acontecem depois de uma apropriação do pai ideal – incorporação identificante que forma o ideal do eu e organiza o supereg o ideal do eu é um traço amado do pai e o superego os restos inassimiláveis paternos. Destes movimentos resultam o amor idealizado (o traço incorporado) e o ódio paranoico (os restos inassimiláveis) que ressurgem na operação seguinte: “ter alguém” – quando a escolha recai naquele(a) que possui o traço de identificação, o amor acontece; quando, ao contrário, recai sobre aquele que possui os restos inassimiláveis do pai, o ódio perseguidor e persecutório explode. Assim os amores ilícitos se encontram na segunda possibilidade – unir-se àquele que desperta intimamente o ódio perseguidor; mais cedo ou mais tarde, o sentimento paranoico faz sua entrada na intimidade do relacionamento, trazendo consigo toda a destruição que lhe é inerente.
(*) psicóloga e psicanalista