ARTICULISTAS

Antropofagia mundial

A revolução industrial trouxe para o homem a crença no poder

Ilcéa Borba Marquez
ilcea@terra.com.br
Publicado em 06/08/2014 às 22:00Atualizado em 19/12/2022 às 06:33
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A revolução industrial trouxe para o homem a crença no poder da ciência e do conhecimento e para a cena cultural a esperança no futuro; mas a virada do século trouxe consigo a descrença, a inquietude e a desilusão desde seu início marcado pelos conflitos mundiais que neste ano completam 100 anos, juntamente com perguntas que não podem calar: por que as guerras? O destino da sociedade está ligado ao individual? Qual o papel dos grandes líderes nos movimentos que caracterizam “o-Estado-para-a-destruição”?

O século XX, posteriormente conhecido como o século das Grandes Guerras, foi palco de dois momentos cruciais - 1914 a 1918 e 1939 a 1945 - que alguns apresentam como uma Grande Guerra tendo um intervalo de 20 anos. A análise em bloco facilita a comparação com o aproveitamento de dados, pois assim podemos acompanhar o nascimento dos líderes dos movimentos mundiais, suas primeiras experiências marcantes e traumáticas e a repetição infindável posterior das mesmas cenas. Mussolini, Stalin, Hitler, De Gaulle e Churchill estiveram no “front” no primeiro período e do vivido levaram consigo decisões aplicadas posteriormente como se fossem suas próprias assinaturas.

Mussolini retirou da sua experiência em 1914/1918 metas governamentais com  expansionismo territorial, militarismo, nacionalismo e antissocialismo; Stalin pode concretizar a Revolução Bolchevista juntamente a seus companheiros depois que Lenin retornou do exílio na Alemanha com fundos suficientes para o armamento e sustentação econômica das ações, resultado da traição alemã aos russos; Hitler cristalizou seu princípio de não-rendição a preço da própria vida ou mesmo da nação; De Gaulle fortaleceu sua crença na utilização dos tanques de guerra e da participação efetiva depois de ter sido feito prisioneiro no “primeiro tempo”; Churchill a resistência às invasões territoriais depois do fracasso da Campanha de Galípoli ou Campanha de Dardanelos onde 180 000 soldados aliados e 220 000 soldados turcos perderam a vida.

Também encontramos os registros de memória dos acontecimentos de 1914/1918 nos pensamentos que exprimiram e os marcaram: Mussolini – “Se eu avançar sigam-me, se eu retroceder matem-me, se eu morrer vinguem-me”; Stalin – “Não se pode fazer uma revolução com luvas de seda”; Hitler – “A natureza é cruel; então estamos destinados a ser cruéis. Temos de recuperar a consciência tranquila para sermos cruéis”; De Gaulle – “O talento é um título de responsabilidade”; Churchill – “Sucesso não é o final, falhar não é fatal: é a coragem para continuar que conta”. Esses líderes, moldados pelas experiências fatais dos tempos de guerra, legaram-nos certezas para combater o esquecimento da verdade tão comum no social. A partir deles sabemos que os bárbaros estão entre nós e em nós mesmos; não podemos esperar que eles venham de fora, do exterior, para combatê-los.

(*) Psicóloga e psicanalista ilceaborba@netsite.com.br

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