A velocidade das inovações tecnológicas capazes de tornar obsoletos os recém-adquiridos aparelhos eletrônicos e a maneira já aprendida de lidar com eles obriga-nos a um processo ininterrupto de aprendizagem bem como capacidade adaptativa: estamos sempre experimentando a sensação angustiante do não saber e da falta - são questões para as quais o sujeito ainda não encontrou em si mesmo uma resposta. Da mesma forma nossa sociedade atual caótica, continuamente transformada pela ciência e tecnologia, pelas lutas de classes, revoluções e golpes de Estado, onde cada um é envolvido em um turbilhão e se sente vacilar, todos os que pronunciam um discurso do pleno, da harmonia, do consenso e da exclusão dos impuros e traidores são ouvidos com particular atenção, mesmo que suas respostas sejam loucas porque o social e o individual estão ameaçados de dissolução. O homem procura os gurus e os profetas sempre que os valores se desmoronam, quando o sentimento mais comum é a impotência real frente a um mundo que se desestrutura. Este é o tempo dos líderes paranoicos cujo discurso onipotente apresenta uma palavra vivificante, por um ser que encarna a própria sabedoria de um deus que sabe o que quer e sabe também o caminho por onde conduzir a si mesmo e a seus eleitos. Assim é o livro Mein Kampf de Hitler que conduziu a Alemanha até a segunda guerra mundial: sempre que houver perturbações sociais importantes haverá um recrudescimento dos discursos paranoicos e uma possível adesão a eles por mais irracionais que sejam.
Amparada pela vontade de ter uma representação unificada de si mesma, toda sociedade possui também tendências paranoicas e produz discursos paranoicos. Os Estados Modernos são mais do que todos os outros indutores de tais tendências. Ao quererem fazer sua história e construírem seu mundo, eles são obrigados a criar grandes projetos, prometendo a mudança do mundo e um futuro melhor... Como resistir a um programa como este, que dá tudo e de maneira constante? O paranoico vive da massa e pela massa, e ele precisará sempre de novas massas para aclamá-lo, levá-lo mais além. O poder paranoico é a impossibilidade de vencer o narcisismo mais mortal, é o discurso da violência e da destruição disfarçada de amor. Na origem de construção da personalidade paranoica está a posição perseguido-perseguidor que num sistema social paranoide aparece nos discursos de seus líderes. Basta ler os discursos de Hitler, de Khomeini ou de Lula para compreender que eles se vivenciam como perseguidos que devem fazer face a um mundo hostil que não quer admitir o bom fundamento de suas palavras.
(*) Psicóloga e psicanalista