Pensamos os líderes na plenitude potencial de ser e, nos esquecemos de abrir espaço
Pensamos os líderes na plenitude potencial de ser e, nos esquecemos de abrir espaço para as doenças físicas, para a deterioração mental, para o fim da sua capacidade produtiva. O texto de Vallejo-Nagera (Considerações sobre o poder político e psicopatologia) - inova ao publicar o relato do psiquiatra espanhol Dr. José Germain, então residente na Clínica do Professor Alajuanine, em Paris/França que, “estando de plantão, trouxeram um homem que passeava nu, durante a noite, pelas ruas de Paris, com sinais de obnubilação, motivo pelo qual, felizmente, em lugar de levá-lo à delegacia trouxeram-no à clínica. Ao se desanuviar o paciente, comprovou-se com assustado assombro que era o presidente dos Estados Unidos. Pode-se esconder o incidente e Woodrow Wilson prosseguiu sua carreira política, tendo recuperado, na aparência, a integridade do seu psiquismo.”
Posteriormente percebia-se, em seus discursos, a perda doentia do contato com a realidade, confundida então com seus desejos, em plena campanha para o Tratado de Versalhes de 1919, após os conflitos armados da Primeira Guerra Mundial. Seu último discurso em 25 de setembro do mesmo ano é um “alarde de distorção patológica da situação”. Nessa mesma noite, teve um colapso no trem presidencial e três dias mais tarde, já na Casa Branca, ocorreu o acidente vascular que o deixou hemiplégico e incapacitado, embora continuasse como presidente dos Estados Unidos até 4 de março de 1921. Durante este tempo de impossibilidade para o exercício das atividades na situação de líder de um país que negociava a paz na Europa, sua esposa servia de intermediária e filtro dos assuntos que deveriam chegar ao seu conhecimento e opinião, mesmo que não estivesse em condições de um julgamento inteligente sobre eles!
Woodrow Wilson deixava naqueles com quem convivia impressões precisas e inquietantes a ponto de expressarem: “Acho que jamais conheci um homem cuja aparência geral mudasse tanto, de hora para hora. Não é apenas seu rosto que sofre mudanças. Trata-se de uma das personalidades mais difíceis e complexas que já encontrei. É uma pessoa tão contraditória que fica difícil firmar um julgamento sobre ele.” (Cel Edward House)
Não foi só Woodrow Wilson o único a apresentar distúrbios mentais durante o exercício de altas funções de poder. Podemos citar vários deles: Krushchev, Mao, De Gaulle, Franco, Tito, Hitler, Mussolini, Roosevelt e Churchill – todos inevitavelmente demonstraram menos faculdades que eles mesmos, dez anos antes de terminar o seu mandato sendo, no entanto, mantidos no poder mesmo assim. Nestes líderes – seres excepcionais que mobilizam multidões – há às vezes traços anormais de personalidade, que se desenvolvem patologicamente pela própria dinâmica da paixão de mandar. A destruição exemplar de valores morais também se apresenta comumente como temos visto neste Brasil atual.
(*) Psicóloga e psicanalista