ARTICULISTAS

Educar para violentar

Não faz muito tempo, durante as solenidades de Conclusão do Curso de Magistério, ouvi, nas palavras do paraninfo: este dia deveria ser “feriado nacional”

Ilcéa Borba Marquez
ilcea@terra.com.br
Publicado em 23/06/2010 às 19:43Atualizado em 20/12/2022 às 05:48
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Não faz muito tempo, durante as solenidades de Conclusão do Curso de Magistério, ouvi, nas palavras do paraninf este dia deveria ser “feriado nacional”, pois mais uma turma de normalistas termina sua formação e o corpo docente da cidade será acrescido de mais professoras já preparadas para atuação imediata no mercado de trabalho; mais uma turma de profissionais do ensino fundamental iniciará suas atividades, nesta importante tarefa de formar pessoas através da transmissão dos saberes, do desenvolvimento de novas habilidades, na estruturação moral e ética de suas personalidades.

Agora, numa decisão governamental conjunta do Executivo e do Legislativo, foi realmente decretado “feriado nacional” todos os dias em que acontecerão os jogos futebolísticos brasileiros durante esta campanha mundial. O Brasil, de acordo com os desejos do seu representante maior – o presidente Lula – irá parar a fim de acompanhar os vinte e três vagarosos hexalionários, que durante noventa minutos correrão atrás da bola na tentativa de marcar os esperados gols! Estes são ídolos nacionais e até mesmo mundiais, conhecidos e reconhecidos até por quem não acompanha a vida futebolística brasileira já que ocupam diariamente as manchetes midiáticas de todos os níveis. A justificativa é que futebol é a alegria do brasileiro!

Quando ouvi o discurso do paraninfo da turma de normalistas achei um exagero, mas, agora depois deste decreto oficial – não que eu seja contra qualquer tipo de alegria e, principalmente alegria do povo – pensei que esta diferença de tratamento entre as esforçadas professoras e os bem situados rapazes da alegria popular, talvez esteja na base destes últimos acontecimentos entre professores e crianças que nos estarreceram: se houvesse um reconhecimento justo ao valor do ofício de ensinar, se estas mulheres não se sentissem tão violentadas tanto socialmente pela irrisória retribuição financeiro/econômica das suas lidas; quanto familiarmente pela tríplice jornada de trabalhos, ou pelos mandos e desmandos dos maridos imaturos; se elas também pudessem enfeitar suas orelhas com os quilates de puros brilhantes que as fotos e imagens televisivas dos artistas do futebol nos mostram, os sentimentos vividos seriam totalmente diferentes e, a agressividade atual poderia se tornar carinho e acolhimento, até mesmo porque ninguém é capaz de dar o que não tem! E, quem sabe então este país poderia ser não apenas o país do futebol, mas sim a pátria provedora de todos os brasileiros.

(*) psicóloga e psicanalista

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