O século passado se tornou conhecido por ser o palco das neuroses. Nos hospitais ou consultórios
O século passado se tornou conhecido por ser o palco das neuroses. Nos hospitais ou consultórios, os neuróticos encenavam seus conflitos, onde a repressão dos impulsos sexuais mostrava a magnitude das lutas entre os desejos e as leis. Estas predominavam impondo limites intransponíveis e àqueles só restava o aprisionamento, pleno de consequências, no interior do eu. As histéricas atraíam os estudiosos, com suas dramaticidades, revelando aos observadores atentos as razões dos mais variados sintomas – desde as paralisias às insensibilidades ou perdas de funções corporais, como a fala, ou ainda as grandes dificuldades alimentares. Os neuróticos obsessivos conseguiam sua cota de admiradores pela rigidez moral de suas atitudes e comportamentos e sinalizavam compaixão pelo excesso de rigor com que se tratavam – mais uma vez a lei moral, então rigorosíssima, comprovava sua força e eficácia.
Cem anos depois, os dramas em encenação modificaram seus roteiros e, naturalmente, seus atores, bastando apenas relembrar os últimos e recentes acontecimentos: no trabalho impera a “Lei do Gersom” (preciso levar vantagem sempre, independente do outro); na sociedade os jovens ou os adolescentes tardios se entregam de corpo e alma às experiências prazerosas, sem nenhum constrangimento se é (ou deveria ser) pública ou privada; nas escolas o desrespeito aos professores ou às normas de convivência estabelecidas deixa todos perplexos, sem uma orientação clara e definida de regras para resolver conflitos ou comportamentos inadequados; nas famílias os muito jovens (bebês que ainda nem se tornaram independentes das fraldas) estão no comando – seus pais, tios, avós e amigos de relacionamentos se mostram perdidos e entregam a direção de tudo aos pequenos ditadores. Nem é preciso dizer que em todos esses exemplos não somos capazes de reconhecer nenhuma lei social e muito menos uma obediência às mesmas.
Em psicanálise, a Estrutura Perversa se caracteriza pela obediência a uma lei própria, e não àquela apregoada socialmente e que serve de limites à maioria. Joel Dor faz o seguinte retrato falado do pervers “o perverso regra sua conduta sobre a realização de seus desejos, de seus apetites, sem consideração pelo que se pode chamar de sentimento da dignidade individual e de respeito a outrem...” Dá para reconhecer o nosso tempo?
(*) psicóloga e psicanalista