ARTICULISTAS

Família: espaço circular de suas fantasias

Em nossos dias, verificamos a formação de uma nova família a partir do encontro de um casal

Ilcéa Borba Marquez
ilcea@terra.com.br
Publicado em 05/11/2019 às 17:46Atualizado em 18/12/2022 às 01:39
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Em nossos dias, verificamos a formação de uma nova família a partir do encontro de um casal que se funda na convivência imaginária inconsciente fortemente marcada pela idealização. Em outras palavras: entre tantas possibilidades os olhares (do casal) se atraem pelo reconhecimento nebuloso de semelhanças históricas inconscientes, uma vez que o “outro diferente” só é visto atrativamente quando o sujeito suporta uma desvalorização narcísica – o mundo não se confunde comigo, não é obrigatoriamente igual a mim.

 Cada grupo familiar faz referência a um contexto cultural que exerce um papel modelador indicando as formas e períodos do desmame, as modalidades de alimentação, a relação corporal próxima ou censurada pela sua erogeneidade, etc. O casal se constitui em porta-voz das crenças, ideais, proibições, valores que, por sua vez, fazem parte de um discurso social mais amplo, ao qual todos estamos assujeitados. A família é provedora de modelos identificatórios inicialmente dentro da própria família até se referirem ao social mais amplo.

Pertencer a uma família obriga a criança a renunciar ao desejo de se constituir em único objeto da atenção parental e à onipotência do desejo de acordo com a “cultura familiar”, que revela uma forma especial de “estar no mundo”. Como exemplo podemos citar as famílias com vínculos simbióticos ou fusionais nas quais a diferenciação encerra perigos fantasiados de destruição, morte ou loucura. Cada filho tem inconscientemente definido um lugar no grupo familiar, desde antes de seu nascimento, ao ser engendrado. Uma criança poderá ter a função inconsciente de preencher o vazio deixado pela perda de outro filho, ou desaparição de outra figura significativa no grupo familiar. Para D. Anzieu, “todo espaço psíquico, seja individual, grupal ou institucional, sugere um envoltório que delimita e ao mesmo tempo tem função continente, de tal forma que assegura uma proteção”.

Ao mesmo tempo, percebemos que a leis e as proibições que regulam as relações sociais e interpessoais têm se transformado em referências ambíguas e inoperantes. Em consequência, a vida psíquica fica ancorada em um equilíbrio dinâmico pela fratura ou fissura que se produz nos envoltórios psíquicos, grupais e comunitários que tradicionalmente outorgam sólidas referências de sentido. Pensando no discurso contemporâneo que tenta impedir os pais de significarem seu filho como homem ou mulher na crença de que a própria criança defina seu sexo...

(*) Psicóloga e psicanalista

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