Mais do que nunca os brasileiros se interessam pelo conhecimento dos fenômenos de massa, necessários à compreensão e provável controle das seguidas e extensivas manifestações dos últimos dias. Desde o início destes movimentos reivindicatórios tem-se procurado sua liderança, somente para ser surpreendido pela ausência de organização sistemática ou vínculo que pertença a um grupo social com história e membros associados de carteirinha. Os intrusos (partidos políticos ou organizações sindicais) foram banidos pelas palavras de ordem e até mesmo pelas ações de repúdio.
Alguns autores sistematizaram algumas ideias sobre o fenômeno de massa: Le Bom (La psychologie des foules) nos diz que “a massa é um ser provisório, composto de elementos heterogêneos que se unem por um momento”. Ela dota os indivíduos de uma “espécie de mente coletiva que os faz sentir, pensar e agir de maneira muito diferente daquela pela qual cada membro dela, tomado individualmente, sentiria, pensaria e agiria, caso se encontrasse em estado de isolamento”. Em continuação, Bon ainda nos fala que a massa é impulsiva, mutável e irritável; não pode tolerar qualquer demora entre seu desejo e sua realização; é crédula e aberta a influências; tem um sentimento de onipotência e não conhece nem a dúvida nem a incerteza. Ela também está sujeita ao poder verdadeiramente mágico das palavras e nunca ansiou pela verdade; exige ilusões e não pode passar sem elas.
A leitura destas citações nos faz refletir que a massa funciona de forma contrária à consciência e à racionalidade; portanto é inconsciente e irracional. Sua forma de comportamento aproxima-se da vida onírica ou do mundo dos sonhos e afasta-se da vida diurna ou racional: não julga, não respeita a realidade, não distingue o possível do impossível, não leva em conta a dúvida, não pesquisa a verdade, é egoísta, imediatista, onipotente, sugestionável e infantil.
A repetição de slogans, de canções, de palavras de ordem aponta para o poder mágico das palavras presentes nas passeatas – crença na transformação imediata e direta da realidade sem as ações necessárias, sustentada apenas pela linguagem encantada, enfeitiçada, artística e repetitiva. Estas palavras dão presença à ausência e realidade aos desejos, por ela tem-se a impressão de que o dito se tornou realidade imediatamente.
Esta movimentação popular dos últimos dias no Brasil caracteriza o fenômeno de massa tal como foi teorizad os indivíduos se reuniram por motivos imprecisos ou desconhecidos, se estimularam mutuamente, sem outro objetivo a não ser demonstrar seu descontentamento com a situação atual que podemos resumir por: ausência de representatividade real do povo pelo corpo político atuante (governam apenas em nome próprio), o que causa uma verdadeira dicotomia entre a população e suas necessidades frente às decisões de gabinete ou votações mediante propina que se transformam em mensalões, desvios de dinheiro e corrupção.
(*) Psicóloga e psicanalista
