Mestre ou professor?
Ensinar significava formar integralmente uma pessoa através de suas próprias condutas ao longo de um tempo de íntima convivência, que assim se tornavam modelos
Ensinar significava formar integralmente uma pessoa através de suas próprias condutas ao longo de um tempo de íntima convivência, que assim se tornavam modelos, bem como de seus saberes verbalizados em forma de diálogos e nascidos das questões que o viver provocava. Isto porque o aprendiz acompanhava seu mestre no seu dia-a-dia, nas suas tarefas comuns ou não, aprendendo com as ações e palavras de seu educador. Platão, por exemplo, não nos legou nenhum texto, nenhuma aula escrita ou sintetizada em pequenas notas, seus ensinamentos aconteciam nas conversas diárias e constantes ao longo de todo o tempo que passava com seus discípulos nos famosos passeios dialogados e foram por eles relembradas.
A partir de Aristóteles as sabedorias acumuladas foram escritas, editadas, mas ainda se referem ao tempo do Mestre, pois Aristóteles repetia a forma de ensinamento que aprendeu com Platão e orientava seus discípulos durante as longas conversas mantidas nos passeios diários e, é bom refletir também sobre este prisma, sem tempo determinado de começo ou fim de aula.
Os tempos obviamente são outros: as instituições de ensino nos diversos graus administram a transmissão dos conhecimentos e a formação dos indivíduos de acordo com regras e técnicas. Assim existe um lugar, um tempo, e uma sequência pré-determinada para que a transmissão do saber ocorra. As aulas estão previstas num calendário semestral, num horário de funcionamento e o conteúdo dividido em matérias e disciplinas organizadas de acordo com o perfil que se quer formar e num crescente de dificuldades e aprimoramentos. Aos alunos cabe acompanhar participativamente pela atenção durante as exposições e desenvolver as atividades solicitadas como estudos, pesquisas e monografias. Aos professores cabe a seleção e preparação dos textos teóricos bem como das técnicas de ensino que serão aplicadas. Não podemos nos esquecer de todo o processo avaliativo que define os resultados em termos de notas ou conceitos.
É evidente a diferença entre as épocas – mestre ou professor! Para os antigos mestres esta nova forma de transmissão do saber está sustentada por falácias: a primeira porque se baseia nos textos escritos. Estes eximem o homem do exercício da memória e produzem o esquecimento no psíquico dos conhecimentos adquiridos; porque confiando na escrita procurarão fora de si mesmos, graças aos caracteres a eles estranhos, o meio de relembrarem, e não dentro de si e graças a si mesmos. A segunda é que a ciência apresentada em textos é a ilusão da ciência e aqueles que repetem estes textos ao invés de sábios se terão tornado sábios de ilusão. (Continua.)
(*) psicóloga e psicanalista
