Quem conhece a tragédia de “Sófocles: Édipo Rei” se lembrará da importância que neste texto têm a figura
Quem conhece a tragédia de “Sófocles: Édipo Rei” se lembrará da importância que neste texto têm a figura e a palavra de Tirésias, o Oráculo de Delfos. É a ele que Édipo dirige perguntas referentes ao seu futuro e conhece, assim, seu destino parricida e incestuoso. E, apesar da sua tentativa de fugir ao que lhe estava predestinado, efetiva as profecias na inconsciência de fazê-l tal qual um cego comete o assassinato ao pai e recebe como prêmio partilhar a cama da mãe.
O oráculo era a divindade que respondia a consultas e orientava os crentes, revelando-lhes seus destinos. Inspirava aos antigos plena confiança, por isso podemos afirmar uma crença irremovível na existência de um destino que cabia a cada um apenas aceitá-lo. Esta crença arraigada se apoiava na total submissão a uma vontade determinante de um Ser Superior, que a tudo comandava. Durante muito tempo, o homem não passava de uma marionete, que se abandonava humildemente ao bom condutor: o próprio Deus.
Esta submissão escravocrata está totalmente fora dos ideais contemporâneos. Muito ao contrário, a rebelião adolescente evidencia o desejo de tomar aos seus cuidados a direção da própria vida dos jovens que é aplaudida pela sociedade e incentivada por pais e professores. A palavra de ordem é que nem a genética é destino e assim os cirurgiões plásticos reincorporam os antigos oráculos, realizando profeticamente todos os atos de insubmissão ao biologicamente herdado ou fisiologicamente envelhecido. Na nova ordem, retocar a aparência é dever de todos, padronizando o efeito aos novos deuses do destino.
Do nariz desproporcional aos olhos marcados pelo tempo; da boca chupada, ressecada pela perda hídrica da idade, aos seios amolecidos ou pouco volumosos, passamos agora para os bumbuns avantajados e arrebitados, capazes até mesmo de segurar um copo! Aquilo que pertencia a uma determinada raça ou característica de algumas pessoas agora se torna acessível aos afortunados pelo dinheiro. Nada é levado em conta: as dores, os desconfortos ou prováveis rejeições de características biológicas e alérgicas – um ideal de beleza, difundido pelos “marketeiros” do consumo, apregoados massivamente pelos canais midiáticos, mais uma vez aprisionam e submetem, recapturando o homem nos laços e fios das marionetes, agora conduzidos por outros deuses – os da beleza vendida a varejo ou atacado. A certeza que resulta é que o homem não consegue ser “senhor” de si mesmo, encontrando sempre alguém que o aprisione e o subjugue.
(*) psicóloga e psicanalista