Essa cena aconteceu durante a marcha de aproximação do Sinai numa guerra que se queria santa (Guerra Santa turco-alemã) com a chegada da sagrada Bandeira verde de Meca. Estávamos no ano de 1914, mais precisamente em 20/12, perto do Portão de Nablus.
A notícia da chegada da Bandeira verde sagrada vinda de Meca disparou demonstrações tempestuosas: numerosos clérigos mulçumanos, anciãos da cidade, escolas e associações, alguns a pé, alguns em carros, outros a cavalo, reuniram-se para recebê-la. Quando a carreta se aproximou, houve uma comoção indescritível, que rapidamente se transformou em ameaça à vida, porque todo mulçumano crente queria beijar a sagrada Bandeira. Foi um momento perigoso, porque quem vinha portando a Bandeira era um xeque idoso – o santo homem de Meca.
Jerusalém se transformou durante todo o trajeto que atravessava a cidade velha até o portão de Damasco: mulheres e crianças em seus trajes típicos coloridos se apinhavam nos balcões e os homens abençoavam as tropas com óleos de rosa – um júbilo poderoso tinha se apossado de toda a população –, este era o desejo do Kaiser desde a viagem ao Islã e o próprio enlevo sentido que deu estrutura e se aninhou na base dos preparativos para esta contenta “santa”. O Kaiser Wilhelm acreditava nos resultados positivos de uma Guerra Santa capaz de se espalhar pelo mundo, dando força e resistência aos contendores, já que se sustentava em forças miraculosas, extremamente fortes, presentes em locais profundos do ser humano, onde a racionalidade era suplantada. Para ele, todos os crentes mulçumanos adeririam ao lado dos turcos/alemães pela sintonia aos objetivos sagrados – seria uma guerra capaz de suplantar as diferenças de raças e línguas pelo contexto maior de fiéis X infiéis.
Não podemos recriminar àqueles que se deixaram levar pelo entusiasmo depois de assistirem essa procissão em Jerusalém. Parecia que a batalha por Suez estava conseguindo adesões. Grupos de exploradores avançados começaram a se infiltrar pelo deserto do Sinai para cavar poços de água que abastecessem o Exército otomano, deixando também mantimentos e sentinelas defensivas nos locais. Por trás das linhas inimigas no Egito, espiões turcos distribuíam propaganda da jihad e divulgavam notícias sobre o próximo ataque, preparando o terreno para a guerra. Com toda essa fanfarra pela Guerra Santa, os alemães e turcos tinham, na realidade, pago para ver seu próprio blefe. As bases da fantasiosa vitória e domínio mundial alemães estavam lançadas. A eterna disputa entre parentes – primos e irmãos – seria mais uma vez encenada.
Ilcea Borba Marquez
Psicóloga e psicanalista
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