A resposta é imediata: pedimos essa tal felicidade
A resposta é imediata: pedimos “essa tal felicidade” e a maneira de conservá-la. Em termos psicanalíticos, o propósito da vida é simplesmente o programa do princípio do prazer. A felicidade provém da satisfação de necessidades represadas em alto grau, e quando essa satisfação se efetiva e se prolonga por algum tempo experimentamos um sentimento de contentamento muito tênue. Em outras palavras, quanto maior o desejo e obstáculos maior também o prazer vivenciado; da mesma forma ao desejo há muito acalentado, cuja realização se mantém no tempo, restará a vivência de um contentamento menor.
Mas, a realidade humana marca sobremaneira a infelicidade: a infelicidade do nosso corpo “condenado à decadência”, infelicidade frente a uma natureza e eventos naturais obstinados a nos destruir, infelicidade presente nos relacionamentos amorosos em seus desafios e limites. Ao longo do tempo, o homem tenta fugir das situações de sofrimento empregando técnicas de prevenção ou até mesmo de negação, por exemplo, da falência corporal; de proteção crescente frente as forças naturais altamente perigosas e destrutivas; de fuga sistemática das oportunidades de encontros afetivos e amorosos; da utilização de substâncias que produzem experiências prazerosas como a droga, o álcool ou os medicamentos; ou ainda a contemplação do belo nas diferentes modalidades artísticas. A todas e a cada uma das buscas de prazer e afastamento do sofrimento, a cultura social interporá ressalva ou proibição, impedindo a livre técnica pessoal para evitar o desprazer. Esse é o fruto da experiência humana de sociedade – a vida nos grupos sociais.
A fragilidade individual ordenou a vida social criando os códigos de civilidade que, enfim, se responsabilizaram pelas renúncias e desgraças dos homens, apesar de permitirem a garantia sobre a natureza e a transformação do homem em pequenos deuses agora desiludidos com o progresso científico e técnico. O homem é um indivíduo obstinado, que torna a civilização responsável por sua miséria, como se ele pudesse ter uma medida objetiva da miséria e como se o indivíduo não soubesse que sentimento de felicidade e sentimento de infelicidade são coisas eminentemente subjetivas.
A vida em comum só é possível se ao invés de reinarem as relações de força que fazem prevalecer o arbitrário e as pulsões não domesticadas, dominarem as relações codificadas que designam a cada um seu lugar, suas obrigações e deveres. O homem percebeu que podia melhorar seu destino pelo trabalho em comum e, ao mesmo tempo melhorar sua vida amorosa na medida em que mantivesse relações genitais estáveis e duradouras. Assim a civilização se responsabiliza tanto pela compulsão para o trabalho atual quanto pelo poder do amor que tenta impedir as perdas amorosas dos pares homem/mulher, mãe/filho. A civilização nos diferencia dos animais e serve a dois intuitos: proteção contra a natureza e regras para ajustar os relacionamentos mútuos.
(*) Psicóloga e psicanalista ilceaborba@netsite.com.br