ARTICULISTAS

Pra não dizerem que não falei de flores

O personagem Sassá Mutema (novela O Salvador da Pátria) despertou meu interesse

Ilcéa Borba Marquez
ilcea@terra.com.br
Publicado em 25/03/2015 às 20:14Atualizado em 17/12/2022 às 00:51
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O personagem Sassá Mutema (novela O Salvador da Pátria) despertou meu interesse a partir de um depoimento do ator Lima Duarte ao descrevê-l Sassá Mutema era um nada – não sabia ler, não sabia escrever, não sabia falar, era frágil e ingênuo; mas tinha um dom natural com as plantas que vicejavam ao seu toque. Sua bondade se confundia com simplicidade, fechando a caracterização do homem bom ligado à terra e ignorante. Este dom com as plantas se assentava no mito do homem natural, uma crença no poder que a proximidade com a mãe natureza possibilitaria, perdida para sempre à medida que o homem buscou o conhecimento e o desenvolvimento intelectual. Na sequência da trama, o Sassá Mutema se encontra com a Professora Clotilde – uma professora idealista –, por quem se apaixona quando ela lhe ensina os conteúdos básicos da leitura e da escrita. Esse progresso pessoal do personagem boia-fria culmina com a sua entrada para o mundo político, onde, apesar de ser um defensor da honestidade, comprovando retidão de caráter e boas intenções, perde, no entanto, o dom de recuperar as plantas.

Esta novela emplacou grande sucesso em 1989, momento histórico/político brasileiro de retomada da democracia, com o fim da ditadura militar, que, se por um lado sugeria a expectativa de salvação do país num líder inculto, ligado ao campo e à natureza, por outro, salientava os riscos da proximidade com a sujeira do poder, trazendo, inevitavelmente, perdas significativas. Podemos dizer que estes são os encantos e desencantos de participar direta ou indiretamente da vida política e dos políticos.

O último 15/03 trouxe à cena dos debates o importante lugar que a participação popular maciça ocupa nas direções governamentais. Inicialmente, foi a expectativa da chuva ou do sol praquele esperado dia. Depois foi colocar a camisa amarela/verde e se unir a todos os outros identificados com a inquietude e o desamparo dos últimos tempos.

“Caminhando e cantando e seguindo a canção...” Ainda não foi composta uma canção que substitua esta, do Geraldo Vandré, na força realista dos seus versos. A emoção de estar num grupo coeso e forte, que sabe sua direção e vai à busca do seu futuro é plena e indescritível. O Hino Nacional embala na abstração da pátria, livrando do flagelo coletivo experimentado até então, quando as ações do governo priorizam alguns em detrimento de todos os brasileiros, a ponto de vislumbrar uma cisão e/ou uma verdadeira guerra entre irmãos. As adesões são orgásticas, verificadas quando os motorizados dividiram a avenida com os pedestres, preenchendo o espaço aberto das ruas e avenidas com o sonoro roncar dos motores. Emoção também sentida quando os cavalos montados apareceram elevando a altura e força do movimento. Assim, este dia se torna um marco divisor, tirando da apatia os silenciosos, dando voz clara e audível ao descontentamento, ao apelo à honestidade e lisura imprescindível com “as coisas do Brasil”. (*) Psicóloga e psicanalista ilceaborba@netsite.com.br

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