ARTICULISTAS

Um mito revolucionário

A história pode nos ajudar a compreender os tempos modernos brasileiros onde apesar de todos os pezares as pesquisas de opinião confirmam a aceitação

Ilcéa Borba Marquez
ilcea@terra.com.br
Publicado em 19/05/2010 às 21:52Atualizado em 17/12/2022 às 06:21
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A história pode nos ajudar a compreender os tempos modernos brasileiros onde apesar de todos os pezares as pesquisas de opinião confirmam a aceitação majoritária ao presidente Lula. Durante a Revolução Francesa de 1789 uma camponesa nascida na Ardenne Belga, apática, entediada, doente, esqueceu lentamente seu passado de mulher fácil e de cantora fracassada para se entregar completamente ao amor pela Revolução. Théroigne de Méricourt mito vivo, vira lenda em poemas de Baudelaire e, mais tarde é encarnada no palco por Sarah Bernhardt. Elisabeth Roudinesco realiza um trabalho de pesquisa meticuloso sobre a trajetória dessa mulher, com isso acaba evidenciando as contradições que permeavam o movimento revolucionário.

Fascinada pelas coisas do espírito, numa vida completamente nova, sonhava com felicidade, sabedoria e igualdade. O célebre jardim no Palais Royal foi sua primeira escola revolucionária. São suas as seguintes  palavras: “O que mais me impressionava era um ar de benevolência geral; o egoísmo parecia banido, todo mundo se falava sem discriminação; naquele momento de fermentação, os ricos se misturavam com os pobres e não se recusavam a falar-lhes como a seus iguais; finalmente, todas as fisionomias me pareceram mudadas; cada um desenvolvera seu caráter e suas faculdades naturais. Vi muitos que, apesar de cobertos de farrapos, tinham um ar heróico. Por menor que seja a sensibilidade, não é possível ver semelhante espetáculo com indiferença...”

Evidentemente o Palais-Royal não era tão idílico quanto pretendia a jovem. Grande lugar de prostituição onde os cafés, teatros e casas de jogo tinham se tornado locais de conversa, boatos e opiniões. Ali se comentavam os acontecimentos do dia; “complôs” revolucionários, obscuras intenções da corte, tramóias da “loba austríaca”.

Ler sua biografia é perceber sua facilidade fantasiosa, o mundo entediante que vivia onde haveria o desejo ardente por uma mudança interna, imposta pela dor depressiva, que neste momento revolucionário “confunde” os fatos externos e os desejos internos: acreditando numa mudança pessoal entrega-se de corpo e alma às assembléias, fundando uma sociedade patriótica. Seu trágico fim – a loucura melancólica –, no  entanto, salva-a da guilhotina naquele tempo de Terror que se seguiu ao assassinato do Rei e de todos os líderes revolucionários no inevitável desfecho reativo e culposo, até que uma nova/velha Lei retorna.

(*) psicóloga e psicanalista

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