ARTICULISTAS

Verdade e mentira nas multidões

Conquistar o primeiro lugar, receber medalhas

Ilcéa Borba Marquez
ilcea@terra.com.br
Publicado em 26/09/2012 às 19:44Atualizado em 19/12/2022 às 17:13
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Conquistar o primeiro lugar, receber medalhas pelos atos de heroísmo nas guerras; derrotar o inimigo; vencer seu oponente; ostentar a joia mais bonita; sentir-se admirado...; poderia continuar indefinidamente esta lista apenas para demonstrar a importância da agressividade recalcada mas presente e compatível com a vida em sociedade, cuja fonte estaria nos comportamentos hostis e destrutivos claramente presentes na vida das crianças que ainda não completaram o processo de renúncia às satisfações diretas das tendências agressivas pela educação. As crianças mais novas não têm nenhum escrúpulo moral em bater ou em se apropriar de bens dos outros, e sentem um grande prazer em demolir e destruir os objetos que podem alcançar. É sob a influência da educação e através do recalcamento dos impulsos considerados inadequados, que a criança aprende aos poucos, e bem dificilmente, a abrir mão da expressão direta da agressividade originária em benefício da vida social.

No entanto, a experiência em sociedade em algumas situações específicas como o fazer parte de uma massa facilita, a eclosão de estados violentos, às vezes passageiros, entre indivíduos que, tomados isoladamente, seriam incapazes de tais atos. Há poucos dias vimos pelo noticiário como os torcedores se preparam para assistir a uma partida de futebol com um adversário tradicional: os policiais que interceptaram um ônibus fretado por uma torcida organizada confiscaram porretes, paus com pregos e inúmeras outras armas brancas que comprovavam o espírito daqueles que iam preparados para uma verdadeira guerra e não para um alegre e bonito espetáculo esportivo.

Nessas massas organizadas percebe-se um sentimento de amor comum pelo líder e uma identificação entre todos os membros que reduzem ao mínimo as tendências agressivas no interior do grupo ao mesmo tempo em que aumentam as manifestações de violência direcionadas aos que estão fora ou excluídos do grupo - os “estrangeiros”. A natureza dos laços psicológicos dos membros das massas com seu líder faz aumentar ainda mais a violência potencial em relação aos que não pertencem, uma vez que o líder passa a representar a força repressora existente em cada um. Assim, livres do próprio repressor, a massa se entrega obedientemente ao chefe adorado. É ele quem decide sobre as ações e sentimentos de todos. Se ele deseja alguma vendeta pública, o ódio de seus fiéis adeptos não será contrariado por nenhuma barreira moral, pois é o líder que se tornou responsável.

(*) Psicóloga e psicanalista

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