A abertura temática – Violência Infantil - abarca todas as possibilidades focais do encontro do Infantil com a Violência. O primeiro enfoque que denominaríamos Violência contra o Infantil inclui a pedofilia e/ou a violência por parte de todos aqueles que mantêm contato com a criança: seus pais, familiares, amigos, professores, sistema escolar e a cultura pós-moderna, e, um segundo enfoque – a Violência do Infantil – inclui a violência da criança consigo mesma e com os outros que relacionam com ela. No primeiro, a criança é o objeto da violência, é passiva frente ao ataque dos outros; no segundo, ela é o sujeito e também o objeto da agressão, sendo assim focarei minha atenção na segunda vertente – A Violência do Infantil.
Selecionei um caso que ilustra minha escrita bem como traz a realidade da prática clínica ao debate. Trata-se de uma criança que chegou a mim com três anos e cinco meses de idade com uma queixa de medos intensos, especificamente medo de animais (cachorros) e de pessoas enfaixadas ou com curativos. Este sentimento fóbico, de acordo com sua própria característica se desloca e estende provocando evitamentos cada vez maiores e, assim a criança, aos poucos, não queria sair de casa porque poderia encontrar algum animal ou pessoa machucada. A fuga do social passou a provocar preocupações parentais já que a menina não queria ir à rua nem mesmo para ganhar balas ou sorvete. Quando perguntei à mãe maiores detalhes sobre o med como e quando começou se houve alguma situação que pudesse desencadeá-lo ou que tivesse relação com ele, ela não soube dizer e apenas acrescentou que desde os dois anos de idade já apresentava medo de animais, só que recentemente houve um agravamento e o início das tentativas de evitamentos.
A mãe relata também que sua filha sempre foi muito tímida, que quando iam a alguma festa de aniversário ou encontro familiar a criança não queria sair do seu colo e ficava gelada, com sudorese e expressão de sofrimento, onde podemos reconhecer a crise de angústia.
Nossos encontros iniciais aconteceram com muito choro e angústia, revelando a total impossibilidade desta criança de sair da continência corporal materna para buscar experiências e prazer. O mundo era visto e sentido como ameaçador e perigoso e os outros como possíveis agressores violentos. Nossas atividades iniciais se restringiam ao uso das tintas, sem formas, que eram então manuseadas, misturadas com as mãos lambuzando tudo e todos. (continua)
(*) psicóloga e psicanalista