A busca pela justiça social não é exclusiva de nenhuma ideologia específica e não deve ser usada como pretexto para ataques indiscriminados à livre iniciativa ou ao sistema capitalista, responsabilizando-os pela ocorrência das mais diversas mazelas vivenciadas no Brasil.
Não é nenhum governo ou partido político, mas a própria Constituição da República que estabelece uma ordem econômica baseada na livre iniciativa e na propriedade privada, guiada pelos princípios fundamentais do desenvolvimento sustentável e da justiça social. Esses objetivos, democraticamente elegidos pelo Poder Constituinte Originário nos arts. 1º, IV, e 170 do Texto Maior, buscam fortalecer o sistema econômico nacional em harmonia com o interesse coletivo.
Desde Adam Smith, em sua obra clássica An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations (1776), o capitalismo moderno fundamenta-se no princípio da liberdade econômica como meio de alcançar o bem-estar geral. Smith, com sua célebre metáfora da “mão invisível”, defendia que o interesse individual, ainda que egoísta, promove indiretamente benefícios coletivos, contribuindo para uma ordem econômica espontânea e autorregulada. Esta ideia constitui o cerne do capitalismo liberal ao reforçar a importância da livre iniciativa na promoção da prosperidade econômica e social.
Ainda que alguns autores, especialmente sob a ótica crítica ou marxista, busquem relativizar o papel de Smith como defensor do capitalismo, a literatura econômica consagrada não deixa dúvidas sobre sua posição fundacional. Robert Heilbroner (2000), em The Worldly Philosophers, define-o como o “pai do capitalismo”, e Friedrich Hayek o reconhece como o precursor do princípio da ordem espontânea, alicerce da racionalidade do livre mercado. Joseph Schumpeter (1954), em sua monumental History of Economic Analysis, admite que Smith pode não ter sido o primeiro a falar de temas econômicos, mas foi o primeiro a organizá-los de forma coerente e orientada à liberdade de iniciativa individual.
Contudo, é igualmente verdade que o capitalismo evoluiu muito desde então. De um modelo inicialmente absolutamente liberal, com mínima intervenção estatal, avançou para um sistema mais equilibrado, adaptando-se continuamente às demandas sociais e ambientais contemporâneas. Grandes crises, especialmente a Grande Depressão de 1929, demonstraram que a presença ativa do Estado é necessária para estabilizar economias e reduzir impactos sociais negativos. Essa capacidade de adaptação fortaleceu o capitalismo no cenário global.
Destaca Hélio Afonso de Aguilar Filho que o “capitalismo implica o desenvolvimento de uma racionalidade voltada para o lucro, resultando em um método de empresa” (2011, p. 562). Essa lógica empresarial, porém, precisa conciliar os ganhos econômicos com responsabilidades sociais e ambientais, conceito essencial no chamado “capitalismo humanista”, que visa compatibilizar o progresso econômico com direitos humanos e ambientais, afastando-se do viés raso de individualização dos lucros e socialização dos custos/prejuízos.
Ana Paula de Barcellos reforça essa visão ao explicar que o princípio da livre iniciativa, presente na Constituição, pressupõe a propriedade privada, assegura a liberdade econômica, protege o direito legítimo ao lucro e a liberdade contratual, sempre dentro dos limites da legalidade e evitando abusos econômicos (2020, p. 469).
Seguindo a linha defendida por juristas renomados como Eros Roberto Grau (2004, p. 186-187), Ricardo Hasson Sayeg e Paulo Dias de Moura Ribeiro (RIBEIRO; SAYEG, 2017), um modelo econômico inclusivo, emancipador e sustentável pode efetivamente realizar a justiça social prevista na Constituição.
Sob essa perspectiva, o agronegócio brasileiro emerge como exemplo expressivo dessa evolução, gerando não apenas riquezas econômicas, mas também promovendo inclusão social, emprego e segurança alimentar.
Dados da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) revelam que, em 2024, o setor representou cerca de 22% do PIB nacional. No Estado de Minas Gerais, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o agronegócio foi responsável por mais de 30% das exportações estaduais em 2023, destacando-se nos setores de café, pecuária e grãos. O agronegócio, em suma, impulsiona a economia nacional, gera empregos e arrecadação tributária, promove a inclusão social e fortalece a segurança alimentar, contribuindo diretamente para reduzir desigualdades sociais e regionais.
No entanto, é preciso reconhecer que o setor ainda enfrenta desafios significativos, como desmatamento ilegal e conflitos socioambientais. Assim, é fundamental que os órgãos públicos de controle e o Ministério Público sigam vigilantes e firmes na fiscalização do cumprimento das normas ambientais e sociais aplicáveis ao agronegócio. Isso não significa ser algoz do agronegócio, pelo contrário, com destaque para o Ministério Público, deseja-se contribuir para a construção de soluções e superação dos obstáculos, por meio da regular articulação que deve existir entre os entes dos setores público e privado, alicerçada no diálogo republicano que, por sua vez, inadmite omissões no enfrentamento às ilegalidades.
Conclusão: O agronegócio brasileiro se apresenta como importante força em direção ao desenvolvimento sustentável e à justiça social. Por isso, é recomendável que produtores, consumidores, órgãos governamentais e Ministério Público intensifiquem diálogos e ações conjuntas para garantirem que o setor evolua continuamente rumo a um modelo cada vez mais sustentável, transparente e socialmente justo.