Justiça não é nada, imagem é tudo
Recebi com um misto de estarrecimento e revolta a notícia de que no dia 14 de novembro uma advogada foi impedida de adentrar nas dependências da Justiça Federal da Subseção Judiciária de Uberaba, por estar trajando vestimenta inadequada ao recinto, diga-se, vestido azul de comprimento até o joelho, decote quadrado e alças largas.
Sou advogado militante nesta comarca há mais de 10 anos, e infelizmente não é a primeira vez que me deparo com acontecimentos como este.
Veio à memória um fato acontecido na cidade de Brasília, há alguns anos, quando fui impedido de adentrar ao Supremo Tribunal Federal para assistir a uma sessão “pública” de julgamento, por não estar trajando terno e gravata.
Na ocasião, viajava a passeio pela capital, e no momento da arrumação da mala, terno e gravata não eram uma opção racional, dadas as condições climáticas do local e o motivo da viagem.Fatos como estes, que acontecem aos montes pelo nosso Brasil, traduzem não só as arbitrariedades perpetradas por aqueles que exercem o poder, mas o que é pior, denotam a falência moral instaurada em nossas instituições.
É inconcebível que o Poder Judiciário se ocupe de questões como imagem e vestuário em detrimento da sua função primordial, que é a solução pacífica, justa e célere dos conflitos de interesses entre os cidadãos. Ao usar termos como “austeridade” e “decoro” para definir o que é ou não compatível com o ambiente forense, a Justiça atrai para si a obrigação moral de ser um verdadeiro exemplo de tais princípios.
Mas, casos como aquele ocorrido recentemente no Rio de Janeiro, no qual o Tribunal Estadual manteve a condenação de uma agente de trânsito a indenizar um juiz pelo simples fato de ter parado o veículo do mesmo durante uma blitz da lei seca, só vem a reforçar a certeza de que essa preocupação quase que doentia com a imagem, não passa de pura hipocrisia.
E com tantas contradições em mente, não foi por acaso que me lembrei de uma famosa propaganda de refrigerante, onde se dizia “imagem não é nada, sede é tudo.”.
Fica aí a dica para os nossos ilustres representantes do Poder Judiciário, pois o dia em que se praticar verdadeiramente a “austeridade” e o “decoro” no ambiente forense com relação aos usuários da Justiça, que são a própria razão de ser do sistema, a vestimenta dos cidadãos ocupará o seu devido lugar secundário e talvez, nem se perceba mais a diferença entre um terno e um short.