A convivência com atividades das quais dependemos para subsistência, por incrível que possa parecer nos faz, por vezes, incapazes de analisarmos com curiosidade o que ocorre à nossa volta. Tudo nos parece muito natural, ao ponto de imaginarmos que nada depende de nós, ou de alguém, para que aquilo, que até certo ponto pode ser vital, tenha significância. São muitos os exemplos que podemos nomear, mas um deles, importante, é o da dependência que temos de vacas e o seu pasto.
Quem de nós, do interior do país, em nossa trajetória de vida, não conhece ou já conheceu uma vaca? Provavelmente todos nós já vimos e já usufruímos dos produtos que uma vaca pode nos proporcionar. Leite e seus derivados especialmente. E por acaso já nos preocupamos alguma vez de como é que uma vaca vive e sobrevive? É possível que não. Conheço pessoas, até mesmo uma parcela de proprietários de vacas, que não se preocupam muito em como elas vivem. Para estes pecuaristas, donos de vacas, desde que se mantenham dentro dos limites das cercas de arame que as impeçam de sair por aí, já é o bastante; o importante é que elas se mantenham detidas dentro dos limites de quem as retém. Marcadas na cara ou na perna, com sinais que as identificam com o dono, podem até ostentar brincos de controles da sua genealogia.
Mas uma vaca come e bebe, e muito. Uma vaca de 450kg é denominada zootecnicamente como “UA”, Unidade Animal. Um touro é mais do que uma vaca, é uma UA e meia, uma novilha é três quartos de uma UA. Bezerras e bezerros equivalem a ½ UA. Então vamos ao que sustenta as UAs.
Sabe-se e propaga-se com frequência que o Brasil tem o maior rebanho bovino comercial do mundo. Comercial porque a Índia tem rebanho maior numericamente. Mas lá vacas e bois são sagrados. Não os matam para comer a carne e os animais são mantidos integrados com as pessoas em vilas e aldeias, produzindo leite ou tracionando cargas. São animais domésticos.
Já as vacas e os bois brasileiros são semi-domesticados e são alimentados um pouco melhor do que os da Índia, com pastos naturais e artificiais, alimentos estes que objetivam fazer crescer as fêmeas para procriar e produzir leite e os machos para engordar e produzir carne. Para produzirem os rendimentos que se espera que alcancem e ofereçam lucratividade para seus donos, uma UA precisaria comer diariamente cerca de 60 quilos de capim e beber, aproximadamente, 50 litros de água.
No entanto, não é bem assim que se alimenta a maioria do rebanho, de aproximadamente 200 milhões de bovinos no Brasil. O espaço utilizado como pastagem é bem superior a 200 milhões de hectares, ou seja, aloja menos de uma UA por hectare. Por escassez de forragem, uma UA por aqui não chega a ingerir 30 quilos de capim por dia; uma parte dos pastos está degradada e não supre adequadamente as necessidades alimentícias requeridas por milhões de UAs. Esta corrosiva situação leva prejuízos significativos aos donos dos rebanhos, os quais não conseguem dos planteis a produção, a reprodução, a engorda e o aleitamento eficientes. Consequentemente, os bovinocultores não conseguem boa remuneração pelo trabalho que executam, o que, por sua vez, interfere prejudicialmente na economia dos municípios onde estão alojados os animais.
Portanto, é de bom tamanho que procuremos saber como andam as vacas e os pastos dos locais onde vivem. Afinal, a alimentação das vacas pode ser um indicativo, dentre outros, de como podemos avaliar e detectar o grau de desenvolvimento econômico da maioria dos municípios interioranos brasileiros.
José Humberto Guimarães
Consultor para Parcerias e Arrendamentos Rurais
Ex-Secretário Municipal de Agricultura de Uberaba
josehumbertogui@gmail.com