Países compradores de soja e outros grãos brasileiros, cumprindo normas internacionais que atuam para conter desmatamentos locais, vez ou outra estão propalando medidas intimidadoras ao nosso processo de crescimento agrícola. Estes sugestionam que a continuidade destes procedimentos expansionistas pode comprometer os negócios de importações destes alimentos.
A insinuação da vez vem da China, maior parceiro comercial do Brasil, que anunciou a decisão de rastrear parte da produção de soja oriunda do País. O anúncio é da maior empresa de processamento de alimentos chinesa. Segundo ela, a fiscalização visa reduzir os danos ambientais realizados no cerrado brasileiro. A apuração se dará na safra 2020/2021 e vai abranger áreas que produzem cerca de sete milhões de toneladas da oleaginosa.
Advertências como esta vêm ocorrendo há tempos e de certa forma, parece, é um dos componentes do jogo de cena que envolvem negócios de grande monta, buscando, com determinadas pressões de um lado, conseguir cessões e, de outro, vantagens.
As safras de grãos do Brasil têm crescido anualmente de forma consistente. A atual, do ano agrícola 2019/2020, está sendo fechada em 250 milhões de toneladas, sendo que a soja alcançou novo recorde de 125 milhões de toneladas. A soja é o nosso principal produto de exportação e a China é a maior compradora deste grão. Em 2019, das 82 milhões de toneladas importadas pela China, 60 milhões foram produzidas no Brasil e a previsão é que este quantitativo aumente neste ano. A China tem como sua principal plataforma de governo estabelecer segurança alimentar para a sua população de um bilhão e 400 milhões de pessoas – 20 por cento da população global. Para tanto, recompôs até mesmo um dos princípios básicos da sua política social de uso da terra, modificando-o de cessão graciosa para o de arrendamento contratado com o Estado até o ano de 2053. A contratação permite a quem queira dispensar a área liberdade de transferir o arrendamento a quem queira cumpri-lo. Essa medida que envolve 550 milhões de camponeses pretende transformar uma agricultura de subsistência precária em uma atividade agrícola produtiva e comercial.
São notórios, portanto, os motivos que forçam os chineses a manter com o Brasil uma relação comercial consistente e duradoura, ou até mesmo permanente, que lhes garanta o suprimento de alimentos vitais para a sua população. Por isso a estranheza de uma postura como esta, incompatível com as necessidades chinesas de crescimento de compra de alimentos.
A China, não fosse o Brasil com o seu vasto território e a capacidade de gestão e trabalho dos nossos lavouristas, garantindo satisfatoriamente o abastecimento equilibrado daquele país, estaria refém dos Estados Unidos na obtenção de alimentos.
E assim, animados pela crescente demanda chinesa e outros países por alimentos, agricultores brasileiros vêm investindo em tecnologias apropriadas ao cerrado e com práticas modernas de execução das lavouras estão conseguindo elevar a produtividade das culturas ali instaladas.
Todos os países sabem, hoje, que a única nação capaz de garantir a segurança alimentar de vários povos é o Brasil. Esses povos, principalmente os chineses, têm uma necessidade incomensurável de garantir comida nutritiva, saudável, regular e contínua aos seus habitantes.
O Brasil tem terras abundantes em seu território para mais do que dobrar a área de cultivo atual. Para tanto, não necessita de promover desmatamentos. Basta lançar mão das terras de pasto degradado para transformá-las em lavouras, um recurso já em andamento que tanto beneficia a pecuária quanto eleva a produção de grãos.
José Humberto Guimarães
Consultor para parcerias e arrendamentos rurais; ex-secretário de Agricultura de Uberaba