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Pandemia aumenta cegueira tratável, diz pesquisa

Leoncio Queiroz Neto
Publicado em 14/01/2022 às 20:15Atualizado em 18/12/2022 às 17:52
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A catarata responde por 49% dos casos de perda da visão no Brasil. Pior: Pesquisa do Instituto Penido Burnier, conduzida pelo oftalmologista Leoncio Queiroz Neto, presidente do hospital, aponta redução no país de 47,2% nas cirurgias de catarata no primeiro ano da pandemia.

O levantamento tem como base os relatórios do SIA/SUS (Sistema de Informações Ambulatoriais do SUS), que revela 384,4 mil implantes de lente intraocular dobrável para eliminar a catarata, de janeiro a agosto de 2019, e 202,9 mil cirurgias no mesmo período de 2020. Em 2021, entre janeiro e agosto, ocorreu recuperação de 55% no número de cirurgias, comparado a 2020, mas, ainda assim, os 314,6 mil procedimentos realizados pelo SUS de janeiro a agosto deste ano está 18% abaixo do realizado no mesmo período de 2019.

Para Queiroz Neto, já era esperado que a pandemia tivesse impacto maior sobre a visão dos idosos, uma vez que o envelhecimento aumenta os problemas de visão. Outra evidência disso é a queda de 35% nas consultas oftalmológicas realizadas pelo SUS durante a pandemia, apontada pelo CBO (Conselho Brasileiro de Oftalmologia), do qual o médico faz parte. O CBO também revela que até julho deste ano foram realizadas 265 mil cirurgias de catarata. Significa que no mês seguinte foram realizadas 49,6 mil novas cirurgias.

O oftalmologista afirma que muitos têm medo de operar por falta de informação e esta é uma das causas do alto índice de cegueira por catarata. A cirurgia é o único tratamento para a doença. “O procedimento é rápido, dura 15 minutos; a anestesia é local, com aplicação de colírio no olho, mais sedação para o paciente relaxar”, afirma. “Consiste no implante de uma lente que substitui o cristalino, lente interna do olho que se torna opaca, como um vidro embaçado.” A maior causa da catarata, explica, é o envelhecimento. “Mas a doença também pode surgir em jovens quando há casos na família; resultar de um trauma no olho; da falta de proteção contra a radiação ultravioleta do sol, ou do uso contínuo de corticoide”, salienta.

Quando operar. Os primeiros sinais da catarata sã visão embaçada, troca frequente de óculos e dificuldade para dirigir à noite. O médico ressalta que quanto menos brasileiros operam, maior o custo social. Isso porque, para cada real gasto no procedimento são economizados 4 reais. Por exemplo, comenta, uma estimativa do Ministério da Saúde aponta que três em cada dez brasileiros com mais de 60 anos sofrem, pelo menos, uma queda anualmente. A visão embaçada pela catarata é, sem dúvida, uma importante causa de ferimentos nos olhos, fraturas e acidentes no trânsito, porque diminui a visão de contraste e de profundidade, pontua. No consultório, comenta, é comum atender idosos que não conseguiram renovar a CNH. A dica do especialista é sempre passar por um exame oftalmológico antes da prova para garantir a renovação. “Quando a visão atrapalha as atividades, é hora de operar”, afirma.

Diagnóstico de glaucoma também encolhe. Queiroz Neto afirma que a pesquisa junto ao SIA/SUS também mostra que em 2019, até o mês de agosto, comparado ao mesmo período de 2020, a tonometria, exame que mede a pressão intraocular para diagnosticar o glaucoma, encolheu 39,4%, caindo de 3,88 milhões para 2,35 milhões. O oftalmologista explica que a doença é apontada pela OMS (Organização Mundial da Saúde) como a maior causa global de cegueira irreversível. Não dói, nem apresenta sintomas no início. Geralmente, aparece em quem já passou dos 40 anos, sofreu trauma ocular, é afrodescendente ou oriental, tem doenças que alteram a vascularização do olho, como miopia ou diabetes, e em pessoas com alterações na anatomia dos olhos que dificultam a circulação do humor aquoso, gel que preenche o globo ocular.

O oftalmologista destaca que na pesquisa também comparou o número de tonometrias entre 2020 e 2021 até o mês de agosto. A quantidade de exames realizados aumentou de 2,35 milhões para 3,47 milhões, respectivamente, evidenciando, portanto, um aumento de 47% nos exames, que ficaram 10% abaixo de 2020, quando a pandemia chegou ao Brasil. Outra revelação do levantamento é que as consultas no SUS com bateria completa de exames para detectar o glaucoma, que inclui, além da tonometria, a campimetria ou medição do campo visual, que vai sendo perdido na doença, e a fundoscopia, para checar alterações no nervo óptico, representam menos de 10% das consultas que incluem apenas a tonometria.

Segundo o oftalmologista, o maior risco do glaucoma é a falta de sintomas, que faz metade dos brasileiros diagnosticar a doença em estágio avançado.

A estimativa do CBO é de que a doença hoje atinge 2,5 milhões de brasileiros e o envelhecimento da população deve aumentar este número. Queiroz Neto explica que 90% dos casos são do tipo primário de ângulo aberto, caracterizado pelo aumento da pressão interna do olho, e requer uso contínuo de colírio. Os outros 10% restantes são do tipo primário de ângulo fechado, mais frequente em orientais. Provoca o súbito aumento da pressão intraocular, causado pelo fechamento da câmara anterior do olho devido ao espessamento do cristalino ou da borda da íris, bloqueio pupilar relacionado a medicamentos, ou à combinação dessas alterações. O médico afirma que o fechamento do ângulo requer atendimento oftalmológico imediato.

Os sinais de alerta sã enxergar halos, dor de cabeça, visão turva, náusea e vômito.

Cirurgia de catarata pode reduzir a pressão intraocular. Queiroz Neto ressalta que muitas pessoas têm a falsa crença de que pacientes com glaucoma não podem passar pela cirurgia de catarata. Não é bem assim. Ele conta que muitos passam a controlar melhor o glaucoma após a cirurgia de catarata, inclusive com a diminuição do número de colírios usados. Isso porque, a substituição do cristalino por uma lente intraocular maleável facilita a circulação do humor aquoso.

Menos colírio. A boa notícia é que um estudo publicado no The Lancet revela que a cirurgia de catarata pode ser adotada como tratamento de primeira linha do glaucoma primário de ângulo fechado. Realizado com 419 portadores de glaucoma, o estudo submeteu 208 participantes à cirurgia de catarata. Três anos depois, os pacientes operados permaneceram usando menos colírio; a pressão intraocular se manteve 1 mmHg menor que os não operados; a função visual e a refração também apresentaram melhora. Entre os 211 participantes que passaram pela iridotomia a laser, técnica cirúrgica utilizada em pacientes com glaucoma na qual é feito um furinho na íris para facilitar o escoamento do humor aquoso, o uso de colírios caiu muito pouco. Três participantes ficaram permanentemente cegos, contra 1 do grupo que operou catarata; a função visual e a refração permaneceram inalteradas.

Queiroz Neto afirma que os casos de glaucoma muito avançados inviabilizam o controle do glaucoma apenas com a cirurgia de catarata. Outra variável elencada pelo médico é já ter passado por iridotomia.

Leoncio Queiroz Neto

Oftalmologista; presidente do Instituto Penido Burnier

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