Prezado, como vão as coisas por aí? Faz tempo ensaio em escrever-lhe. Faltavam-me disposição e coragem para tocar em assuntos que inevitavelmente não tem como fugir de uma conversa nossa. Pena é que já não estamos conseguindo estabelecer datas para, pessoalmente, colocar o papo em dia. Como sei também que não é dado a debruçar-se em redigir uma carta, que já é também um meio de comunicação beirando a obsolescência. Entretanto, resolvi recorrer-me a ela para iniciar um diálogo, acreditando que obterei resposta de alguma forma. Espero que se encontre em boa saúde, com a costumeira disposição para suas caminhadas e que ainda cultiva o bom gosto de apreciar uma boa cerveja nas merecidas tardes de sábado com amigos leais a essa causa, que é um hábito de grande satisfação social e de deleite para a mente. Encontros esses que tão sabiamente tornava-os inesquecíveis pelo bom humor e a perspicácia peculiares e especiais em sua maneira de ver e interpretar a vida e suas nuances, com a certeza de que sempre estaríamos nos acrescentando. Infelizmente, o tempo e a distância estão ditando outros caminhos e impondo-nos a impossibilidade desses momentos impagáveis. Desejo podermos, o mais breve possível, estar juntos a uma mesma mesa em qualquer canto daí ou daqui. Os anos vão afunilando nossas expectativas e limitando nossa imaginação a um passado com certeza muito maior que o futuro, este que certamente é a abstração temporal para o qual projetamos sonhos, desejos, fantasias. Quando o futuro chega, ele está no presente, ou seja, tudo é passado no presente, inclusive o nosso intangível futuro. Daí a necessidade de desfrutarmos tudo que nos aproxima e torna-nos amigos no presente. Nele referenciamos todo o tempo, o que se foi, o que é e o que virá. Podemos fugir de todos os tempos, menos do presente e, se é assim por inevitável relação cronológica, viva o presente. Leia a carta com o habitual e espontâneo carinho para que possa me enriquecer com suas sábias ponderações. Por aqui, não sei se anda acompanhando, lhe adianto que não há no presente nada de bom que se acrescente. Tempos sombrios de desfaçatez, hipocrisia, malandragem, descrença e muito mau exemplo. Este é o presente que parece nos tirar o futuro. Um forte abraço...
(*) Engenheiro