É certo que a literatura árabe, de idade acima de milenar, viva desde o século VI, tem joias preciosas de incalculável valor histórico, intelectual e humano. Pérolas inestimáveis, cuja avaliação não se pode traduzir em dinares. Vale muito mais que qualquer combo de colares, relógios, pulseiras e anéis. Também teria outro tratamento nas aduanas mundo afora. Tem o poder de enriquecer a alma e nutrir o intelecto. Não sei quantas vezes a valorosa corporação de servidores da Receita Federal, nos aeroportos internacionais brasileiros, já se deparou com a entrada de qualquer uma das infinitas obras que compõem a magnífica e brilhante narrativa árabe em prosa e verso. Um tesouro que é sempre bem-vindo e não necessita de fundo falso para ser escamoteado. Não é mercadoria para ser apreendida, e sim aprendida. Joia de incalculável quilate, “As Mil e Uma Noites”, perpassa e dura séculos e perpetuará por incontáveis milênios durante a existência humana na Terra. A obra narra a história do Rei Xariar, da Pérsia, que, traído pela esposa, mandou matá-la. A partir daí, passa cada noite com uma mulher diferente, que era degolada no dia seguinte. Eis que surge Sherazade e se oferece para passar uma noite com o Rei. Ela se utiliza de um estratagema infalível para não ser morta na manhã seguinte. Conta ao soberano histórias extraordinárias que não se findam na mesma noite, atiçando a curiosidade do monarca, mantendo-se viva noite após noite. “Aladim e a Lâmpada Maravilhosa” é um desses contos noturnos que integram “As Mil e Uma Noites”. Quem nunca ouviu falar de Aladim e também de Sherazade? Somados e passados séculos, a obra se materializa agora em macabra trama. São Mil e Uma tentativas para liberar as joias árabes clandestinas. São Mil e Uma versões para justificar o descaminho flagrado. São Mil e Uma manobras para tentar sobreviver politicamente. São Mil e Uma histórias da Carochinha que nem Aladim acreditaria. Não há gênio, nem lâmpada mágica que consigam lavar os diamantes pilhados. Mil e Uma Noites serão insuficientes. Em 2011, o ex-presidente deposto da Tunísia ditador Zine El Abidine Ben Ali e sua esposa, Leila Ben Ali, foram condenados a 35 anos de prisão por roubo e posse ilegal de dinheiro e joias. Também foram condenados a pagar 91 milhões de dinares tunisianos, equivalentes a 66 milhões de dólares. Essa, mais que um conto, é uma lição das Arábias.
Luiz Cláudio dos Reis Campos