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De Nietzsche a Lacombe: Deus e o seu paradeiro

Luiz Cláudio dos Reis Campos
Publicado em 11/12/2023 às 18:16
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Pode Deus ser bom para todos ao mesmo tempo? Faço esta pergunta a mim mesmo, já há bastante tempo. Todas as vezes que a indagação me ocorre, invariavelmente a resposta é não. Agora ela reaparece, procurando novamente uma resposta. Quando se apela ao Criador para que ELE se junte em defesa de uma causa e a mesma não é universal, e sim de um segmento, está se solicitando a Ele parcialidade, que, certamente, é incompatível a uma divindade.

Deus não altera placar de futebol, nem resultado de eleição. Envolvê-Lo nesses assuntos é, no mínimo, ignorar o Seu significado, Sua onipotência, trazendo-Lhe constrangimento e um enorme aborrecimento. As coisas de Deus, creio, estão em um patamar pouco ou nada mundano. Mas é sensato supor que descuidos ocorrem de forma inapelável e irretratável em diversos episódios da história humana, posto entender que Sua existência só pode ser constatada a partir da nossa existência. Recentemente, li excelente artigo de Milly Lacombe, quando ela trata da desistência de Deus com relação à humanidade. “Deus vazou”.

E indaga: “Quem não vazaria”? Nietzsche foi mais além e decretou Sua morte, “Deus está morto”. Ambos, Milly e Nietzsche, convergem quanto à ausência de Deus em momentos cruciais. Para um, Ele está morto; para a outra, Ele vazou. Seriam intermináveis as indagações sobre o seu paradeiro em incontáveis episódios trágicos, cruéis e vergonhosos da humanidade. Por onde andava no holocausto? Onde foi parar no genocídio armênio? No holodomor ucraniano? O que fazia na Inquisição? E no massacre em Ruanda? Onde se encontrava enquanto galés partiam da África com negros amontoadas na indigência para cumprirem o calvário que peregrinam até hoje, desalojados e deslocados que foram de suas terras? Por onde perambulava quando Oppenheimer costurava a explosão atômica?

E, atualmente, onde anda? Onde se faz notar? Não pode estar na fome que assola e aniquila milhões de vidas diariamente, nem tampouco nas palafitas e esgotos a céu aberto. Muito menos no afundamento de Maceió e menos ainda no derrame de Brumadinho. Mas, então, que caminhos Ele percorre? Por onde passa? Seguramente, não é pela Cracolândia, nem pelos yanomamis, com mais de 520 mortes evitáveis de crianças. O dilema divino parece confirmar e, ao mesmo tempo, desafiar a desconfiança de Milly e a sentença de Nietzsche.

Talvez Deus não tenha vazado, nem esteja morto, apenas se esconde nos versos de Fernando Pessoa: não sei por onde vou, só sei que não vou por aí. E é nesse por aí que Ele deveria ir. Por falar nisso, apareça lá em GAZA e diga: Eu sei por onde vou. Milhões por lá O aguardam, em uma de suas versões, milenarmente.

Luiz Cláudio dos Reis Campos

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