Por onde começar uma história sem começo, sem enredo, sem roteiro, sem nexo...
Por onde começar uma história sem começo, sem enredo, sem roteiro, sem nexo, sem explicação? Por quanto tempo acreditar na inevitabilidade da hora da partida, na inexorabilidade do destino e na implacável lógica divina? Onde se sente a presença do Criador? Nelson Rodrigues disse que Ele está nas coincidências. Passei a buscar explicação pela reflexão de Nelson e confesso não me sentir por satisfeito, talvez suspeito, para alcançar e encontrar nas coincidências a presença de Deus. Em que ordem de grandeza sentimental e emocional podemos sentir a intervenção divina, ou sua agradável companhia que nos faz sempre agradecer e reiterar a certeza de que Ele sabe o que faz e aceitar os desígnios reservados a todos nós aqui na Terra. Auschwitz e Treblinka não eram coincidências, eram obras de humanos que não se achavam coincidentes com outros semelhantes e em nome dessas não coincidências o Holocausto desafiou a presença de Deus e perpetrou-lhe um grande golpe. Assim como Hiroshima e Nagasaki, o genocídio armênio, e tantas outras atrocidades. Seriam esses acontecimentos coincidências? Não se pode admitir, a asseverar a máxima de Nelson. Deus não pode estar nessas coincidências, portanto, sua ausência o livra de cumplicidade. Para Dostoiévski, se Deus não existe tudo é permitido. Mas tudo parece mesmo ser permitido, eis uma coincidência. As coincidências são ao acaso e suas ocorrências são inesperadas, o que as aproxima muito da sensação de surpresa. O acaso é a negação de causa, e negação de causa é a própria contradição a Deus. Tudo faz sentido e tudo tem uma causa, um nexo, uma explicação. Nada é por acaso. Há que se afastar diametralmente o acaso da coincidência, são eventos distintos que se contrapõem a inquietude da fé ou da incredulidade. E paradoxalmente um evento é razão do outro. O acaso nem sempre se transforma em coincidência, mas a coincidência é obra de algum acaso. Sendo assim pode-se dizer que Deus é obra do acaso. Sofisma ou silogismo? Cada um reage a sua maneira e convicção, o importante é respeitar e admitir que todos têm direito de questionar e buscar explicações para suas inquietações. As informações trazidas a respeito de prática constante dos voos da Lamia viajarem no limite do combustível necessário, sem nenhuma reserva, não é uma coincidência, é uma reincidência. Não é nenhum acaso, é um descaso, onde tudo foi permitido. Daí deve se deduzir a ausência de Deus no voo da Chape.