Ouvi de um amigo, talentoso com um violão debaixo do braço, que se reconhece o bom violonista pelo lugar do braço do violão onde ele dedilha seus primeiros acordes. Se for no meio do braço, já dá pra notar que se trata de um qualificado instrumentista. O assunto foi rendendo a partir de um comentário que fiz referente à música “Beijo Partido”, de Toninho Horta, que me disseram, tempos atrás, tratar-se de uma obra que apresenta grande dificuldade para tirá-la ou tocá-la no violão. Meu amigo confirmou. Para saciar minha curiosidade, fui ao YouTube assistir ao Toninho Horta cantar e tocar “Beijo Partido”. Não deu outra, iniciou a canção com o acorde no meio do braço do violão. Toninho, nada mais nada menos, foi considerado o 5º maior guitarrista do mundo pela revista britânica “Melody Maker”, em 1977. Integrou a antológica “Progressions – 100 years of Jazz” (EUA, Columbia/Legacy 2005), como um dos guitarristas mais influentes do mundo do jazz no século XX. Dando sequência à jornada do meio do braço, fui à captura de outras sumidades e lá busquei João Bosco, em “O Bêbado e o Equilibrista”, iniciando os acordes pelo meio do braço do violão, equilibrando o bêbado em sua caminhada trôpega de quatro minutos no ziguezague entre a primeira e a sexta corda, ora cambaleando em mais de uma, ora pulando uma ou mais de traste em traste como dormentes a pavimentar a volta do irmão do Henfil com tanta gente que partiu num rabo de foguete. Prosseguindo a jornada do meio do braço, encontrei Toquinho passando seus dedilhados em “Aquarela”, tocando os tons da “Tarde em Itapuã”; com o poeta vagabundo Baden Powell, em “Asa Branca”, ardendo em notas e acordes, fazendo o violão cantar “Rosinha guarda contigo meu coração”; Paco de Lucía, “nadando em lágrimas, tocando as canções de sereia”. Decidi encerrar a jornada do meio do braço com o oitentão Chico Buarque, que se enganou ao dizer que a Rita “levou os meus planos, meus pobres enganos, os meus vinte anos, meu coração e além de tudo me deixou mudo um violão”. São mais de seis décadas traçando cordas de tantas obras-primas com o movimento de acordes como um balé na ponta dos dedos da mão. Fica aqui uma lição do violão: quando tocar uma pessoa que lhe é muito especial, toque-a no meio do braço e deslize até a mão para se afinar com ela.
Luiz Cláudio dos Reis Campos