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O cenógrafo oceanógrafo

Caçador de celacanto, Omar Salgado sonhava encontrar o peixe nas águas oceânicas

Luiz Cláudio dos Reis Campos
lucrc@terra.com.br
Publicado em 19/05/2011 às 20:45Atualizado em 20/12/2022 às 00:15
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Caçador de celacanto, Omar Salgado sonhava encontrar o peixe nas águas oceânicas. Celacanto é um fóssil vivo. Muitos acreditam ser o remoto ancestral dos tetrápodes e do próprio ser humano. Há controvérsias, entretanto é cercado de muita cobiça e curiosidade por sua origem longeva (quatrocentos milhões de anos). Omar o procurava no litoral sul-africano e na Indonésia. Também trabalhava em grandes aquários montando cenários, reproduzindo o habitat marinho, um minitalassociclo, atrás de vidros transparentes que possibilitam aos visitantes observar peixes, algas, corais, tartarugas, tubarões, menos o celacanto.

Leitor assíduo adorava Júlio Verne e Hemingway. Do primeiro sorvia Viagem ao centro da Terra, com as lições de abismo necessárias para enfrentar o desconhecido, o inimaginável e as profundezas cheias de surpresas, sobressaltos e mistérios do miolo terrestre. De Hemingway, O velho e o mar era o predileto. Apreciava a luta intensa do ancião em busca do peixe (espadarte). Quando, finalmente, o velho o fisga, um cardume de tubarões deixa o peixe sem carne, apenas carcaça.

Os dois livros ajudavam Omar a se prevenir de ataques inesperados e imprevisíveis. Quando entrava mar adentro, declamava para si mesmo Augusto dos Anjos: “Sou uma sombra! Venho de outras eras, do cosmopolitismo das moneras... Pólipo de recônditas reentrâncias, larva de caos telúrico procedo, da escuridão do cósmico segredo, da substância de todas as substâncias”. Omar se acalmava com esses versos em alto-mar. Sabia que entre ele e o celacanto quatro milhões de séculos os separavam e lhe davam a dimensão de sua existência precária, magistral, frágil, colossal, paradoxo de instantânea mudança, contraste da singeleza, da insignificância e da magnitude da vida.

Não se sabe se Omar encontrou o celacanto. Guardava consigo algo jamais revelado. Quando provocado, evocava Khalil Gibran, “pode contar seus segredos ao vento, mas depois não vá culpá-lo por soprar para as árvores”.

Deduz-se, pelos cenários encontrados em sua casa, que Omar, o cenógrafo oceanógrafo, esteve com o celacanto, mas não o capturou e nem contou pra alguém. 

Final da década de 70, séc. XX, inúmeros muros no Rio de Janeiro foram grafitados com os dizeres: “Celacanto provoca maremoto”. “Celacanto trucida perdigoto”.

(*) Presidente do PSDB Uberaba

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