ARTICULISTAS

Perdas e ganhos

Luiz Cláudio dos Reis Campos
lucrc@terra.com.br
Publicado em 19/05/2014 às 12:12Atualizado em 17/12/2022 às 09:45
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Quando chegou sem avisar percebi que estava de volta. Abriu um cordial sorriso e veio ao meu encontro mirando fixadamente em meus olhos. Abriu os braços e se atracou em mim descansando uma de suas faces em meu peito. Sua respiração ofegante denunciava a intensa emoção do momento. Não ousei inaugurar conversa.

Sabia que era preciso ouvir seu silêncio que gritava dentro de si. Contive-me e apenas abriguei-a com o calor do meu corpo que naquela hora fervia febril de intensa e pueril alegria. Estava de fato ansioso pela revelação que se avizinhava e a qualquer momento seria anunciada. Mas o tempo era dela e somente ela podia resolver a melhor hora de dizer. Continuei firme, estático e simbiótico emprestando o que ela queria de mim e sorvendo dela o que era alimento pra mim.

De repente meneou a cabeça como se quisesse indicar incredulidade. Senti este movimento pelo seu roçar em meu peito. Era o primeiro sinal de animação de quem permanecia inalterada, na mesma posição de quando se ancorou em mim. Com a palma da mão direita batucou em minhas costas naquele ritmo lento e compassado que permite mais de uma interpretação.

Podia ser de saudade, de recordação, de reencontro, até de mágoa, mas mágoa não era não. Apenas notei que era uma alegria triste. Fiquei encabulado. Portanto, estes dois únicos movimentos, o da cabeça e da mão direita, não eram suficientes nem para supor o que poderia ser. Quando achei que iria intensificar seus gestos e começar a falar, subitamente volta, agora com a outra face, a descansar em meu peito. Estranhei muito, porque já imaginava que ela fosse revelar os motivos ou o motivo de sua presença. Porém, continuei no meu propósito, apenas tratei de respeitar e permanecer refém do seu tempo.

Tinha uma vontade incontida de que ela falasse algo e desnudasse aquele mistério que revestia nosso reencontro e logo retomássemos o cotidiano, eu com meus afazeres e ela com os dela, assim como sempre foi. Não podia quebrar o silêncio e o encanto deste encontro. Porém, agi de forma a intensificar nosso contato corpóreo e apertei fortemente meus dois braços entrelaçando suas costas a fim de provocar uma reação para destravar e descontrair nossos semblantes e nos permitisse aproveitar o merecido e desejado reencontro.

Para mim já era hora de recobrarmos do susto de nos vermos e estarmos ali um diante do outro. Senti que isto estava prestes a acontecer. Ela novamente dava sinais vitais, sua pulsação estava acelerada. Começou a desvencilhar-se de mim. Vi que estava perdendo-a novamente. Abraçava-a fortemente, mas não mais conseguia senti-la.

Foi escapando como água entre os dedos. Minha última lembrança foi quando levantou a cabeça, olhou novamente em meus olhos e disse com ares de alegria triste: ”saudades, mas sabes que não posso ficar. Espero te encontrar lá de onde venho, mas não tenha pressa estou zelando por ti. Quando chegar a hora estarei pronta para te receber”. Fiquei atordoado, reatei meus sentidos e fui buscar nexo. Não encontrei explicação razoável. Acordei suando e aflito, mas aliviado ao vê-la dormindo ao meu lado.

 

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